A Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca) completou em junho sete anos de atuação. Criada em 2016, a iniciativa visa a ajudar os jornalistas na cobertura de pautas relacionadas à educação, além de mostrar a importância do tema para a sociedade.

A ideia para a criação da associação surgiu de um pequeno grupo de jornalistas que já cobriam educação, mas que identificaram a necessidade de maior especialização por parte dos jornalistas. Era preciso qualificar a cobertura do tema. Com isso em mente, Renata Cafardo, Antônio Gois, Fábio Takahashi, Paulo Saldaña, Mariana Tokarnia, Elisangela Fernandes e Margarida Azevedo fundaram em 2016 a Associação de Jornalistas de Educação.

Jornalistas&Cia conversou com Renata Cafardo, uma das fundadoras e atualmente presidente da Jeduca, sobre os sete anos de atuação da associação. Ela falou sobre a importância do jornalismo de educação para a sociedade, sobre o Congresso de Jornalismo de Educação da Jeduca, e outras ações que a associação faz e fará para valorizar ainda mais esse tema, e trazê-lo para os destaques da imprensa e da mídia como um todo.

Vale lembrar que as inscrições para o 7º Congresso da Jeduca já estão abertas. O evento, que conta com apoio institucional do Jornalistas&Cia, será realizado em 18 e 19 de setembro, na Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), em São Paulo. O tema será Que sociedade queremos? O jornalismo de educação no debate nacional.

Confira a entrevista na íntegra a seguir:

Jornalistas&Cia Como ocorreu a criação da Jeduca? Como surgiu a ideia de criar uma associação focada em jornalismo de educação?

Renata Cafardo

Renata Cafardo – A Jeduca foi criada em 2016. Eu e mais um grupo de jornalistas que já cobriam educação há algum tempo percebemos que existia uma dificuldade de se cobrir educação e entender os termos, a importância da educação na sociedade. Notávamos que a cobertura e o interesse no assunto iam crescendo.

Antes, as matérias eram sobre mensalidades, coisas mais básicas, que não se aprofundavam no tema de educação. Nos últimos 20 anos houve esse crescimento, a imprensa começou a escrever sobre políticas públicas e a importância da educação para o País. Sentimos que existia a necessidade de qualificar os jornalistas, pois nem todos são especialistas em educação. Até hoje, temos poucos setoristas na área, entendemos que às vezes uma pauta de educação cai no colo de um jornalista e ele fica perdido, não sabe como fazer a cobertura. Então, tivemos essa ideia de criar uma associação para auxiliar esses jornalistas na cobertura da educação.

Uma das iniciativas da Jeduca foi a contratação de uma editora pública, Marta Vancini, que atende de forma gratuita a qualquer repórter que esteja fazendo matéria sobre educação e tem dúvidas sobre fontes, contexto, entre outros. Os veículos tradicionais, jornais, televisão, rádios, que não têm editor especializado em educação, então nossa editora pública está aí para ajudar esses repórteres.

Além da editora pública, temos também vários guias, sobre primeira infância, ensino técnico, financiamento de educação, entre outros assuntos. A Jeduca tem também uma ferramenta de busca que ajuda os jornalistas a encontrarem dados governamentais sobre determinado assunto relacionado à educação.

Uma das grandes missões da Jeduca é qualificar ainda mais o jornalismo de educação, pois dessa forma estamos contribuindo para a própria educação do Brasil, não só jornalisticamente. Ao mostrarmos para a sociedade uma discussão mais qualificada e fazermos com que a população entenda melhor a educação e possa cobrar melhor a sua educação pública, nós estamos melhorando o País como um todo. Essa é a importância do jornalismo de educação de uma maneira geral, não só para os jornalistas e para a imprensa, mas para toda a sociedade.

J&Cia – Quantos associados a Jeduca tem hoje? E de quais regiões?

Renata – Atualmente, temos o total de 1.736 associados, sendo que quase 68% deles são do Sudeste, pouco mais de 10% do Sul, também próximo de 10% no Nordeste, e mais de 11% somando os associados do Centro-Oeste e do Norte do Brasil.

Nossa intenção é justamente chegar a outras regiões. Além dos associados, temos também embaixadores da Jeduca, que são jornalistas de todas as regiões que divulgam a entidade em seus estados. Uma de nossas grandes preocupações sempre foi sair desse eixo-Rio-São Paulo-Brasília, que é onde está a maioria dos jornalistas de educação. Em todas as nossas ações buscamos diversidade. Por exemplo, no Congresso estamos dando 30 bolsas para jornalistas comparecerem, nós financiamos tudo para que essas pessoas venham e assistam ao evento. E selecionamos esses jornalistas a partir de critérios de raça e gênero, mas também pensando na diversidade regional; por isso, entre esses jornalistas estão pessoas de quase todos os estados do Brasil.

J&Cia – Fale um pouco sobre o Congresso, como surgiu a iniciativa, e quais são as novidades para a edição de 2023?

Renata – Logo no começo percebemos que precisávamos de um encontro para debater o jornalismo de educação. Antes, só existia o congresso da Abraji como referência de encontro de jornalistas, e nos inspiramos nele para fazer um congresso sobre educação. Surgiu dessa ideia de trocar experiências e discutir o trabalho do jornalismo de educação, além da oportunidade de trazer pessoas de outras regiões, com diferentes ideias. Tanto o jornalismo como a educação são essenciais para uma sociedade mais justa, democrática, ambos têm essa importância, então quisemos juntar essas duas áreas.

Sobre o Congresso de 2023, uma das mesas abordará educação antirracial, com Nikole Hannah-Jones, jornalista do New York Times que criou o podcast The 1619 Project, sobre o primeiro navio negreiro que aportou nos Estados Unidos; Tiago Rogero, criador do Projeto Querino, da Rádio Novelo. Eles conversarão sobre educação antirracista, sobre as similaridades da história dos negros dos Estados Unidos e do Brasil, e como fomos tirando os negros da nossa história e contando nas escolas uma história que não era verdadeira.

Depois, teremos um debate sobre ataques violentos a escolas, tema que tomou muito a cobertura de educação no primeiro semestre, e algo sobre o que a Jeduca se posicionou muito fortemente. Fizemos recomendações sobre a cobertura de ataques a escolas, e essas recomendações foram seguidas por veículos do Brasil inteiro, alterando totalmente a forma como cobrem esses acontecimentos, com mais cuidado, sem colocar fotos do agressor, sem muitos detalhes sobre os ocorridos, pois pesquisas indicam que essa grande exposição da mídia acaba contagiando outros criminosos, e a probabilidade de novos ataques acontecerem é alta.

Por isso, nesse debate, traremos Sherry Towers, pesquisadora americana/canadense que estuda justamente esse efeito de contágio, e que é autora de uma das pesquisas mais importantes sobre o tema, que serviu de base para organizações e veículos do mundo inteiro. A pesquisadora Telma Vinha também estará presente para mostrar o lado do Brasil nesse assunto.

Teremos ainda outras mesas sobre ataques a escolas, como uma só de professores, que falarão sobre como é enfrentar esses casos de violência. Traremos também jornalistas de outras áreas, de política e economia, para discutir por que educação não entra tanto nos destaques, por que economia e política têm muito mais destaque. Será que são os leitores que não se interessam ou os próprios jornalistas que não têm muito conhecimento sobre a área? Então, será uma mesa com jornalistas que não são de educação para falar sobre como a educação pode estar mais na pauta de todo mundo.

J&Cia – Esses dois temas que você citou, educação antirracial e cobertura de ataques violentos a escolas, são pautas que estiveram em grande evidência nos últimos meses. Além das mesas do Congresso, o que a Jeduca vem fazendo para debater esses temas?

Renata – A educação antirracista é importante em todos os aspectos, é mais do que fazer mesas de debate. Sempre pensamos na diversidade na hora de organizar o Congresso, e também na composição dos próprios debates, isso também faz parte de educação antirracista. Fora do Congresso, fizemos webinars, temos um guia sobre Diversidade, mas não especificamente sobre a questão racial, mas pensamos em elaborar um conteúdo do tipo mais para frente. O jornalismo discutir a educação antirracista é essencial, e por isso é um dos grandes temas do nosso Congresso.

Em relação aos ataques às escolas, também, além das mesas, fizemos as recomendações com pesquisas e estudos sobre o impacto da cobertura da imprensa sobre o tema, fizemos uma ação grande de divulgação desse conteúdo em nossas redes sociais, enviamos a todos os nossos associados. Tudo isso movimentou muito a Jeduca, fez inclusive ela ficar mais conhecida, e ficamos muito felizes que muitos veículos por todo o Brasil passaram a adotar as recomendações, e alteraram a cobertura desses ataques.

J&Cia – Na sua opinião, como presidente e uma das fundadoras da Jeduca, qual a importância do jornalismo de educação para o Brasil e para o mundo?

Renata – Acredito que, quanto mais discutirmos educação de maneira qualificada na imprensa, melhor será a educação em nosso País, pois a sociedade, vai estar melhor informada sobre esse tema e terá subsídios para cobrar, para criticar, para buscar uma melhor educação pública.

Então, acho que é papel crucial do jornalismo de educação trazer a educação para a discussão pública, de uma maneira qualificada, com boas fontes, boas pesquisas, dados corretos e relevantes, ouvindo sempre os dois lados.

Um país que discute pouco a educação na imprensa, obviamente não avança em sua própria educação. No caso do Brasil, temos inúmeros problemas em nossa educação, então, não é só apontar os problemas, e sim apresentar soluções, o que pode dar certo, discutir a educação de maneira geral. Não basta criticar o que está sendo feito. Nosso sonho é que a educação seja um assunto tão discutido e seja considerada de forma tão relevante quanto outros temas, como política e economia, na imprensa como um todo. Queremos a mesma quantidade de manchetes para a educação, porque é uma área crucial para o desenvolvimento do nosso país e para o desenvolvimento de cada cidadão.

J&Cia – O que você enxerga no futuro da Jeduca para os próximos sete anos?

Renata – Esperamos que a gente tenha cada vez mais interesse por jornalismo de educação, que tenhamos cada vez mais estudantes se interessando por educação, desde a faculdade. Quando eu fiz faculdade, não tinha disciplina sobre esse tema, e hoje continua não tendo. Mas, antes, não havia nenhum interesse em jornalismo de educação, já hoje percebemos que o interesse cresceu muito. A Jeduca tem até um edital que premia TCCs sobre educação.

Muitos estudantes vão também ao nosso Congresso, a educação já é uma área de interesse das novas gerações. Então, nosso objetivo é seguir atuando cada vez mais com estudantes de jornalismo, para aumentar ainda mais o interesse na área e para que no futuro tenhamos mais jornalistas de educação querendo cobrir a área. Queremos também chegar a todos os estados, ajudar os jornalistas dessas regiões a se interessarem por educação. A ideia é que a educação sempre esteja em pauta, nos próximos anos, queremos que o tema só cresça na pauta jornalística, e assim a gente consiga, de alguma forma, ajudar também a educação pública brasileira, que é nosso grande foco.


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