Por Luciana Gurgel 

Luciana Gurgel

Rede social preferida de jornalistas, políticos e figuras influentes, o Twitter é um campo minado para quem ainda não entendeu que certas gracinhas podem virar desastre, dependendo de quem publica.

A nova vítima é o repórter David Weigel, do Washington Post, suspenso por um retuíte sexista que, mesmo depois de removido com pedido de desculpas, abriu uma crise interna e externa no jornal.

Twitter, areia movediça para jornalistas, faz mais uma vítima
David Weigel

Wiegel, profissional experiente que cobre política na capital americana, é ativo na plataforma, tuitando e retuitando furiosamente. Quem faz isso nem sempre tem tempo de avaliar as consequências do que compartilha.

Em 2017, o jornalista publicou uma foto de um comício do então candidato Donald Trump mostrando vários assentos vazios. Mas a imagem tinha sido feita antes de o público chegar. Ele se desculpou, porém não aprendeu a lição.

Desta vez a ofensa foi com as mulheres. Wiegel retuitou uma postagem de Cam Harless, coapresentador do podcast “The Mad Ones”, que dizia: “Toda garota é bi. Você só precisa descobrir se é polar ou sexual”.

O retuíte e o pedido de desculpas:

Twitter, areia movediça para jornalistas, faz mais uma vítima

 

Twitter, areia movediça para jornalistas, faz mais uma vítima

Quem gritou foi uma colega de redação, Felicia Sonmez, que ano passado processou o Washington Post por proibi-la de cobrir casos de abuso sexual sob o argumento de que, por ter sido vítima de um, não teria imparcialidade para relatar histórias semelhantes.

Sonmez disse no Twitter: “É fantástico trabalhar em um meio de comunicação onde retuítes como esse são permitidos”.

Segundo a CNN, a jornalista também questionou o colega no canal interno, afirmando que o retuíte enviou “uma mensagem confusa sobre os valores do Post”.

E aí está a questão que aflige corporações e empresas jornalísticas: a conta no Twitter é pública ou privada? Quem tuíta em uma conta assinada como profissional de uma empresa fala apenas em nome pessoal?

O público não percebe assim. E estilhaços de uma postagem como a de Wiegel atingem a empresa jornalística.

Nem todos veem com bons olhos as restrições impostas por empregadores sobre posts em redes sociais. Em 2020, a BBC foi criticada pelo pacote de regras baixado para os jornalistas, que recomendava até não tuitar sob efeito de álcool.

A corporação vive pisando em ovos, porque tuítes de seus jornalistas volta e meia viram notícia, apontados como defesa de a ou b. Na maioria dos casos, são apenas reclamações de incomodados com cobertura negativa.

Mas o episódio de Wiegel entra em outra esfera. Em uma frase, o tuíte conseguiu ser ofensivo a mulheres, a bissexuais e a pessoas com transtorno de bipolaridade.

No caso do Post, há um agravante para a situação: ano passado o jornal nomeou Sally Buzbee, primeira mulher a chefiar sua redação na história, prometendo uma atitude diferente sobre diversidade.

Para tentar apagar o incêndio, Buzbee soltou um memorando exigindo que os repórteres “tratem uns aos outros com respeito e gentileza”. Mas Felicia Sonmez, que teve seu processo contra o jornal arquivado há um mês, não se deu por satisfeita e continuou atirando na direção.

E pior: nem todos entenderam o recado da chefe. A autora da reclamação foi recriminada por um colega, Jose Del Real, adivinhem onde? NoTwitter, claro.

Ele pôs mais lenha na fogueira ao dizer que a tática de Buzbee “não resolve nada”, e arrematou com um caridoso (para com o colega homem) “Felicia, todos nós erramos de vez em quando”.

A questão é o limite entre erro e ofensa – que, no caso, saiu “coassinada” por um dos mais influentes jornais do mundo, que tem como missão denunciar injustiças.

Nesse contexto, fica difícil criticar uma organização de mídia que regula a atividade de seus jornalistas nas redes. Mesmo com desculpas, remoção da postagem e medidas disciplinares, essas histórias têm vida longa nas plataformas.

O caso continua repercutindo, com matérias na imprensa, comentários nas redes sociais e brigas internas. Enquanto isso, o autor da postagem original está fazendo a festa, alimentando a polêmica que lhe deu mais notoriedade.


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