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sexta-feira, maio 3, 2024

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Quando o Juventus ganha o Brasileirão

“Essa conquista é como se o Juventus, time da Mooca, ganhasse o Campeonato Brasileiro”. Assim Oswaldo Luiz Colibri Vitta, diretor da pequena e recente Rádio Brasil Atual, define a vitória de sua equipe na 35a edição do Prêmio Vladimir Herzog. “E foi numa dobradinha muito rara de acontecer. Somos pequenininhos, mas somos bravos”, diz, orgulhoso. A dobradinha a que se refere é a de Marilu Cabañas, que venceu em Rádio com a série Voz Guarani-Kaiowá, e Anelize Moreira, Menção Honrosa na mesma categoria, com Dores do parto. No ar há cerca de um ano, a paulista Rádio Brasil Atual (frequências 93,3 FM em São Vicente, 98,9 FM na Capital e 102,7 FM na região Noroeste do Estado) é obra da Fundação Cultura e Trabalho, que tem os sindicatos dos Metalúrgicos e dos Bancários como sócios. “Quando os metalúrgicos conseguiram a concessão da emissora, implantamos o Jornal Brasil Atual (com duas horas de duração) e boletins de aproximadamente cinco minutos nas horas cheias. Para isso montamos uma equipe de Jornalismo mínima. Temos três repórteres [Marilu, Anelize e Cláudia Manzano] mais uma coordenadora [Terlânia Bruno]. Quer dizer: a Anelize e a Marilu ganharam prêmio, e as outras duas ganharão depois”, brinca Colibri. Além das repórteres, estão no time da RBA os técnicos de áudio Carlos Amaral, André Paroche e Emerson Ramos, que editou as duas matérias vencedoras; o produtor Nelson Calura; os locutores Eli Santos e Fabiana Ferraz; os colunistas Paulo Vanucchi, Frei Betto e Clemente Ganzlúcio; e o correspondente em Berlim Flávio Aguiar. “Estamos começando humildemente, mas mostrando que sabemos fazer Jornalismo. Abordamos o tema Direitos Humanos há muitos anos, quando ainda produzíamos programas isolados para outras rádios, atividade que começou em 2004. Para termos uma democracia plena, ainda precisamos resolver as questões indígena, agrária e de democratização dos meios de comunicação”, comenta. “O prêmio é importante para validar o seu esforço. Sabemos que se não podemos ser os maiores, temos que ser diferentes. Em Jornalismo é necessário investir, tem que mandar o repórter ao local. Eu sou contra a rádio por telefone. Uso o telefone para dar a notícia do dia a dia. Mas quando é preciso aprofundar o tema a repórter tem que estar lá. E isso custa dinheiro, o que considero investimento, não despesa. Estamos agora na expectativa de que, com o prêmio, possamos crescer. Isso anima muito. Eu falo de futebol, mas a comparação é pertinente, porque competimos com equipes grandes, que produzem jornalismo 24 horas por dia. Como nosso time é pequeno, ao mandar uma repórter para um especial, os outros têm que se virar no dia a dia. Logo, o prêmio também é da equipe, que segura esse cotidiano. Temos vários projetos para a rádio, para os quais estamos aguardando investimentos. Os colaboradores que vêm trabalhar conosco sabem que vão ter liberdade para abordar os assuntos. E nós somos alternativos”. A experiência da heptacampeã Sete vezes vencedora, duas vezes Menção Honrosa. Habitué do Herzog, Marilu Cabañas  fala com especial emoção da conquista deste ano: ”Para mim é uma honra, por vários motivos. Primeiro, por ser uma rádio alternativa, pequena, mas grande na liberdade. E isso é um valor raro hoje em dia no jornalismo brasileiro. Segundo porque o tema, os guarani-kaiowá, é pouco abordado pela mídia conservadora, já que mexe com os interesses de latifundiários, da bancada ruralista… O terceiro motivo é que eu tenho raízes guaranis. Minha mãe e minha avó são paraguaias e falam o guarani fluentemente. Infelizmente eu não sou fluente, mas estou aprendendo! Por esses três motivos, esse prêmio tocou de forma especial a minha alma: pela rádio, pela amizade de todos lá; pelo tema dos guarani-kaiowá e por mexer com minhas raízes”.  Marilu diz que a ideia da pauta se deu quando foi acompanhar um encontro de professores indígenas e percorreu algumas aldeias. Os cinco capítulos vencedores do Herzog – denominados A voz guarani-kaiowá – fazem parte de uma série que vem sendo produzida constantemente pela rádio. O recorte trata da luta pela terra da etnia guarani-kaiowá em municípios de Mato Grosso do Sul. ”Na verdade, abordar a questão indígena virou rotina para a Rádio Brasil Atual. A gente faz com prazer, porque sabe que vai tentar ajudar, dar visibilidade a quem precisa, fazendo com que eles tenham seus direitos respeitados. A minha ideia é dar visibilidade aos guarani-kaiowá do Mato Grosso do Sul que, proporcionalmente ao resto do País, são os indígenas que mais sofrem ameaças e são assassinados. Uma cacique, por exemplo, já perdeu cinco pessoas da família. Seria um absurdo você pensar que aqui em São Paulo existisse caso semelhante, mas como são indígenas, são invisíveis no Brasil. Ficaríamos muito felizes, como ganhadores do prêmio, se a PEC 215, que determina que a demarcação de terras passe a ser feita pelo Legislativo, não fosse aprovada. É preciso que a presidente Dilma tenha pulso firme”, diz. O discurso em guarani Marilu surpreendeu o público que assistia à entrega do prêmio em 22/10 por proferir seu discurso em guarani: “Foi uma maneira respeitosa que encontrei de me dirigir à nação indígena. Era o mínimo que eu poderia fazer: me esforçar para falar o guarani”. Reproduzimos a seguir o texto em português: “A vitória é deles” Este prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos é dos guarani-kaiowá. A vitória é deles. Um povo forte, que conseguiu manter até hoje sua língua, o guarani, apesar de todo o massacre que sofreu e continua sofrendo no Mato Grosso do Sul. Líderes assassinados, desaparecidos e jurados de morte. Crianças e adultos atropelados à beira da estrada onde ficam seus acampamentos porque foram expulsos de suas terras, proibidos de plantar, colher e comer suas culturas como milho e mandioca. Muitos passam fome. Mas são fortes. Tenho certeza de que o jornalista Vladimir Herzog sabia da importância cultural dos povos indígenas para o País. E tenho muito orgulho de ter em minhas veias o sangue guarani, herdado de minha mãe Ambrosia Cabañas, de 81 anos, que ainda tem mãe, minha avó Sixta Cabañas, que completou 100 anos, ambas paraguaias que falam o guarani fluentemente. E para terminar desejo que a presidente Dilma Rousseff, os parlamentares e os juízes sejam firmes na defesa dos direitos indígenas consagrados na Constituição Brasileira e não se curvem aos ruralistas. Se isso não ocorrer, esse prêmio não fará o menor sentido. (Tradução: Tonico Benites e Aty Guassu) Presente promissor Formada há apenas três anos, Anelize Moreira completou a história de sucesso da Rádio Brasil Atual no Herzog deste ano ao receber Menção Honrosa já em seu primeiro especial     produzido profissionalmente, com a série Dores do parto. “Foi uma surpresa para mim! Você não pensa que vai ganhar já na primeira série. O prêmio me estimula a fazer outras matérias de fôlego, a sair um pouco da ideia a que somos levados na faculdade de que o bacana é fazer assessoria de imprensa, comunicação interna, deixando as grandes reportagens de lado. Me estimulam reportagens com esse olhar mais humano, mais sensível”, diz. E faz coro com Marilu – que também ganhou menção honrosa pela edição desse especial – quando o assunto é o ambiente de trabalho na rádio, que inclui a liberdade para sugerir e desenvolver pautas. “Eu sugeri o tema porque me senti ofendida como mulher. Não sabia o que acontecia, tanto em maternidades públicas quanto privadas”, comenta. Cria do projeto Repórter do futuro, da Oboré, Anelize participou de três módulos do curso: dois  sobre Amazônia e um sobre conflitos armados. “Foi fundamental para minha escolha de  carreira. Aprendi muito, mais até do que na faculdade”.  

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