Decisão da Justiça do Amazonas ampliou a censura ao jornal O Globo sobre a cobertura do caso Samel, rede de saúde privada que patrocinou ensaios clínicos com a proxalutamida, substância sem eficácia comprovada contra a Covid-19. Em reportagens, o jornal apontou irregularidades e suspeitas de fraude nos estudos. O Globo foi obrigado a apagar textos sobre o caso e proibido de publicar outros conteúdos que citem a Samel.

Na decisão, de caráter liminar após pedido do dono da Samel, o juiz Manuel Amaro Lima, da Terceira Vara Cível e de Acidentes de Trabalho do Amazonas apontou que O Globo teria cometido “excesso de liberdade de imprensa” ao voltar a associar em suas reportagens a rede de hospitais ao estudo que ela patrocinou e propagandeou. Lima considerou também que o uso de fotos de uma live promovida pela empresa pode causar “graves riscos de imputação de danos irreparáveis” à rede de hospitais. O Globo vai recorrer da decisão.

Em agosto do ano passado, o mesmo juiz havia ordenado neste mesmo processo a retirada de três textos da web, novamente atendendo a uma reclamação do dono da rede de hospitais, mas O Globo não havia sido proibido de cobrir o caso.

Em novembro, após reclamação do jornal, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes cassou as decisões de Amaro Lima, destacando que a veiculação das reportagens “ocorreu dentro de parâmetros normais, de modo que a ordem judicial reclamada afigura-se injustificável à luz do direito fundamental à liberdade de expressão e de imprensa”. Mas, após novas decisões da Justiça do Amazonas, O Globo foi obrigado a publicar um direito de resposta da Samel, e a pagar multa em caso de descumprimento.

O Globo recorreu novamente ao STF, mas Mendes negou os pedidos, explicando que sua decisão anterior apenas cassou “a decisão judicial que obstaculizou a divulgação da matéria jornalística de interesse público”, mas que não impedia a “continuidade da análise de pedido de direito de resposta e de indenização”.

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) repudiou a decisão, que classificou como “assédio judicial e tentativa de intimidação ao trabalho jornalístico da colunista de O Globo Malu Gaspar e do diretor de Redação do jornal, Alan Gripp”.

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) escreveu que o ocorrido é um “caso gravíssimo de ataque à liberdade de imprensa por meio de ações judiciais”.

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) considerou “tentativa de intimidação ao trabalho jornalístico a ofensiva judicial da rede de hospitais Samel contra O Globo e condena como atos inconstitucionais de censura judicial as decisões tomadas pela Justiça do Amazonas em relação às reportagens realizadas pelo jornal sobre indícios de fraude e violações éticas em unidades da Samel”.

0 0 votes
Article Rating
Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments