O denunciante do vazamento conhecido como Panama Papers falou pela primeira vez sobre o caso depois de seis anos. Ele procurou recentemente dois jornalistas que fizeram parte do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), que coordenou o vazamento na época, e que hoje estão na revista alemã Der Spiegel. O informante, identificado como pelo codinome de John Doe, conversou com os repórteres Bastian Obermayer e Frederik Obermaier.

Na entrevista, publicada simultaneamente por 53 veículos de 41 países – entre eles o Poder360, único representante brasileiro no grupo −, John Doe declarou que está seguro, e explicou por que só agora decidiu dar sua primeira entrevista. Ele declarou que, nestes últimos anos, sentiu-se tentado a falar, mas teve que considerar outros fatores, como por exemplo, a segurança de sua família.

Doe também falou sobre a ascensão do fascismo e do autoritarismo ao redor do globo, e como os Panama Papers seriam uma ameaça a governos do tipo: “Putin é uma ameaça maior aos Estados Unidos do que Hitler, e as empresas-fantasma são suas melhores amigas. Empresas-fantasma que financiam militares russos são o que realmente mata civis inocentes na Ucrânia enquanto os mísseis de Putin miram em shoppings. Empresas-fantasma encobrindo grandes conglomerados chineses são o que realmente mata menores de idade trabalhando com mineração de cobalto no Congo. Empresas-fantasma cometem esses horrores e mais ao retirar a possibilidade de responsabilização da sociedade. Sem a possibilidade de responsabilização, a sociedade não funciona”.

Graças aos Panama Papers, o violoncelista Sergei Roldugin, antigo amigo de Vladimir Putin, foi alvo de sanções no fim de fevereiro. Sobre o ocorrido, Doe disse que teme pela sua segurança: “É um risco com o qual eu vivo, considerando o fato de que o governo russo expressou que me quer morto”. Ele explicou que o veículo Rússia Today exibiu na época um documentário sobre os Panama Papers, e um personagem chamado John Doe sofre um ferimento na cabeça por causa da tortura e acaba morrendo. Doe também lembrou dos casos dos jornalistas Daphne Caruana Galizia e Ján Kuciak, que participaram dos Panama Papers e foram assassinatos em 2017 e 2018, respectivamente.

Para garantir o anonimato do denunciante, a entrevista foi conduzida pela internet, com a presença de uma testemunha, e criptografada com um software que alterou sua voz. Além disso, como de praxe no jornalismo alemão, a conversa foi enviada ao entrevistado para autorização antes da publicação.

Confira a entrevista na íntegra.

Sobre o Panama Papers

Considerados uma das maiores investigações jornalísticas da história, os Panama Papers vazaram em 2016 cerca de 2,6 TB de informações confidenciais sobre mais de 210 mil paraísos fiscais offshore, de autoria do escritório panamenho Mossack Fonseca, especializado em abrir empresas offshore. As informações foram divulgadas pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), envolvendo cerca de 376 jornalistas de 76 países.

As informações divulgadas causaram enorme impacto ao redor do globo. Graças ao vazamento, os premiês da época da Islândia, Sigmundur Davíð Gunnlaugsson, e do Paquistão, Nawaz Sharif, renunciaram aos seus cargos. Os Panama Papers provocaram também diversos protestos em Londres, Reykjavik e outras regiões do mundo, e desencadearam milhares de investigações. Regras mais rígidas foram aplicadas globalmente sobre offshores.

O caso Panama Papers venceu o Prêmio Pulitzer na categoria reportagem explicativa.

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