Por Cristina Vaz de Carvalho, editora de J&Cia no Rio de Janeiro

Affonso Romano de Sant’Anna morreu nessa terça-feira (4/3), aos 87 anos, em sua casa em Ipanema, zona sul do Rio. Desde 2017 ele sofria de Alzheimer, e estava acamado há quatro anos. O velório foi no Cemitério da Penitência, na tarde desta quarta-feira, e o corpo foi cremado em cerimônia reservada. Sant’anna foi casado com a também escritora e jornalista Marina Colasanti, que morreu em janeiro deste ano (ver J&Cia 1.497). O casal deixou três filhas: Alessandra Colasanti, Alessandra de Sant’Anna e Fabiana de Sant’Anna.

Mineiro de Belo Horizonte, Affonso começou a trabalhar ainda bem jovem para custear os estudos. Participou de movimentos da vanguarda poética nas décadas de 1950 e 60. Em 1961, formou-se em Letras Neolatinas pela UFMG. Ainda nos anos 1960, foi bolsista nos Estados Unidos, quando participou do International Writing Program, voltado para jovens escritores de todo o mundo. Na mesma UFMG, mais tarde, fez seu doutorado.

Poeta multifunção, começamos a descrever sua trajetória pela atuação no jornalismo. Buscou popularizar a poesia escrevendo em jornais por mais de 30 anos. Foi crítico literário. Em 1984, assumiu a coluna anteriormente assinada por Carlos Drummond de Andrade no Jornal do Brasil, até 1988. Drummond seria o tema de sua tese de doutorado. Foi cronista de O Globo até 2005. Participou de programas de TV voltados para a popularização da poesia. Por último, escreveu para os jornais Estado de Minas e Correio Braziliense.

Como escritor publicou cerca de 50 títulos e recebeu diversos prêmios literários. Entre suas obras de destaque estão Intervalo amoroso (1998), Tempo de delicadeza (2007) e Como andar no labirinto (2012). Ao longo da carreira, acentuou o engajamento social, tornando-se um dos nomes mais marcantes da literatura nacional. Na obra Que país é este? (1980), o poeta traça, de maneira lírica, o panorama do Brasil sob o jugo da ditadura e virou um símbolo de mobilização popular.

Além de sua importância como escritor, foi gestor público e desempenhou papel crucial na política cultural do País. Como presidente da Fundação Biblioteca Nacional, entidade vinculada ao MinC, entre 1990 e 96 modernizou a instituição e criou o Sistema Nacional de Bibliotecas. Implementou o Programa de Promoção da Leitura (Proler), que mobilizou milhares de voluntários em todo o Brasil.

Teve movimentada vida acadêmica. Lecionou Literatura Brasileira na PUC-Rio, onde também dirigiu o departamento de Letras e Artes. Antes disso, nos Estados Unidos, em 1965, ministrou curso de Literatura Brasileira na Universidade da Califórnia (UCLA), em Los Angeles, quando também lançou seu primeiro livro de poesias, Canto e palavra. Em 1976, lecionou o mesmo tema na Universidade do Texas, em Austin. Também deu aulas na Universidade de Colônia, na Alemanha; Universidade de Aarhus, na Dinamarca; Universidade Nova, em Portugal; e Universidade de Aix-en-Provence, na França.

Recebeu algumas das principais honrarias brasileiras, como Ordem de Rio Branco, Medalha Tiradentes, Medalha da Inconfidência e Medalha Santos Dumont.

Sobre a própria vida, ele deixou este poema, entre tantos outros:

O que não escrevi, calou-me.

O que não fiz, partiu-me.

O que não senti, doeu-se.

O que não vivi, morreu-se.

O que odiei, adeus-se.


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