Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

Duas semanas após divulgar o censo de representação de gênero no comando das principais redações em 12 países, o Instituto Reuters para Estudos de Jornalismo, em Oxford, revelou outra face da falta de diversidade na mídia: a baixa presença de jornalistas negros e de origem étnica não branca (como asiáticos) em posições de liderança.

O Brasil é um dos cinco países pesquisados, junto com Alemanha, Reino Unido, África do Sul e EUA. Apenas 23% dos chefes de redação nos dez veículos de maior audiência online e igual número de meios offline − um total de 100 na amostra global − são negros ou de outras etnias.

Assim como em 2022, todos os veículos da amostra no Brasil e na Alemanha têm um jornalista branco como editor principal. No Reino Unido,  94% dos que ocupam os cargos editoriais mais altos são brancos.

Como são contabilizados os jornalistas negros e brancos

A forma de codificar os profissionais pode parecer confusa no Brasil, onde a discriminação racial se manifesta de forma diferente da de outras nações como os EUA ou países da Europa.

Para efeito do estudo, os profissionais são codificados como pessoas brancas ou pertencentes a grupos sujeitos a práticas racistas nem sempre ligadas à cor da pele.

O estudo cita dois casos de jornalistas em redações importantes do Reino Unido como exemplos de diversidade na chefia: Roula Khalaf, do Financial Times, de ascendência libanesa, e Zing Tsjeng, do Vice, que nasceu em Singapura. Mas elas não fazem parte da amostra porque os veículos que dirigem não estão entre os de maior audiência.

Nos Estados Unidos, a porcentagem de editores não brancos ficou estacionada em 33% em relação a 2022. Ao mesmo tempo, segundo outro estudo do Reuters, o país recuou na representação de mulheres no comando das redações, que caiu de 50% para 44%.

Na África do Sul, 80% dos principais editores são negros, contra 73% em 2022.

Isso importa? O Instituto enfatiza a importância, tanto simbolicamente quanto na prática.

Indo além da falta de igualdade nas oportunidades de ascensão profissional, o que por si só já seria motivo suficiente para a inclusão, o Reuters defende a tese de que, para o público, os jornalistas nessas funções geralmente representam tanto a sua organização quanto a indústria de mídia como um todo. E tomam decisões que influenciam o tratamento das notícias a partir de seu histórico e experiência de vida.

O mesmo acontece com a representação de gênero, tema de uma edição especial publicada pelo MediaTalks em março, quando se comemorou o Dia Internacional da Mulher.

Pesquisas diversas constatam a invisibilidade e a representação estereotipada de mulheres na mídia de diversos países, até mesmo nos que figuram no topo dos rankings de indicadores sociais. Isso é associado em parte à ausência delas em cargos de comando.

No Brasil e na Alemanha, a predominância total de profissionais brancos liderando grandes redações significa que o público dos 20 meios de comunicação principais consome notícias sem uma perspectiva diversa.

O levantamento sobre o perfil étnico na liderança das redações encontrou, em todos os países analisados, um percentual de jornalistas não brancos em atividade nas redações sempre maior do que a sua participação nos cargos de chefia.

Outro aspecto analisado é o percentual de jornalistas brancos em comparação ao conjunto da população de cada país.

A média de pessoas que não se identificam como brancas nos cinco países somados é de 44%, bem superior ao percentual de diretores de Redação não brancos, de 23%.

O jornalismo não está sozinho quando o assunto é baixa diversidade na chefia. Nos EUA, onde o movimento negro é historicamente bem organizado e conquistou avanços importantes, uma pesquisa feita pelo USA Today em fevereiro encontrou apenas quatro CEOs negros entre as empresas que compõem o S&P 100.

Mas, no jornalismo, a ausência de visões de mundo diferentes no comando tem implicações importantes para a  sociedade. E é para isso que o relatório do Reuters chama atenção, sinalizando a necessidade de um esforço consciente de inclusão que não seja apenas o de promover quem está mais à mão quando uma vaga se abre.


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