Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

Na primeira coletiva do ano sobre a Covid-19 no Reino Unido, em 4/1, as fake news sobre o coronavírus e o ativismo antivacina foram destaque na fala da principal autoridade médica do país, Chris Whitty.

O número de casos novos tem passado de 200 mil por dia. Transporte e atendimento médico sofrem lentidão ou paralisação porque funcionários testaram positivo e não podem trabalhar.

Enquanto isso, os que propagam riscos da vacina e condenam as máscaras colocam as mangas de fora sem que nada aconteça.

Na Grã-Bretanha, o inimigo público número um é uma figura que há alguns anos parecia só exótica, mas se tornou perigosa inclusive fisicamente.

Piers Corbyn, de 74 anos, é irmão de Jeremy Corbyn, parlamentar de Islington, reduto de intelectuais e moderninhos de Londres, que liderou o Partido Trabalhista por cinco anos e teve reais chances de se tornar primeiro-ministro.

 

É preciso controlar o negacionismo e o ativismo antivacina
Piers Corbyn

O irmão radical criava constrangimentos, mas nada comparável ao que acontece agora.

Ele virou protagonista nas manifestações contra medidas de controle da Covid, e fala o tempo todo nas redes sociais contra máscara, distanciamento e vacinas.

Sem receber punição ou ter contas canceladas, ganhou mais seguidores e se entusiasmou, rumando para a violência.

Antes do ano novo, com o país assustado pelo risco de restrições mais severas diante do avanço da ômicron e o governo implorando para que as pessoas tomassem a vacina, ele liderou uma invasão a um centro de saúde.

Colocou em risco a integridade dos profissionais que lá trabalhavam e dos que tinham ido se imunizar.

Em outro ato tresloucado, entrou na movimentada estação London Bridge de cara limpa, empunhando um cartaz que dizia “máscaras não podem impedir a transmissão”, desafiando o regulamento que impede viajar em transporte público sem proteção.

O canto entoado por ele e seus seguidores dentro do metrô  é tão absurdo que virou piada: usar máscara seria tão inútil para conter o vírus como tentar prender gases intestinais dentro das calças.

Piers Corbyn chegou a ser detido por sugerir que escritórios de parlamentares que votassem contra restrições fossem incendiados, sob o argumento de que “é preciso mais atenção física”.

Pode parecer pitoresco. Mas em tempos de redes sociais, os danos causados por esse tipo de comportamento são imensuráveis.

Não se pode afirmar quantas pessoas deixam de se vacinar ou se rebelam contra as máscaras por influência de gente assim.

No entanto, o número de seguidores deles nas redes sociais e de compartilhamentos das bravatas é um sinal de que há plateia.

O mais impressionante é que, mesmo afrontando o consenso científico e a lei vigente, ele continua firme nas redes e nas ruas.

E mesmo que fosse expulso, atos negacionistas promovendo violência são compartilhadas por simpatizantes, lembrando um queijo suíço cheio de buracos.

Ele não é o único. Nos EUA, a parlamentar Marjorie Taylor Greene, expoente do Partido Conservador, foi expulsa do Twitter e suspensa por 24 horas do Facebook no início da semana por um post contendo inverdades sobre a Covid.

É preciso controlar o negacionismo e o ativismo antivacina
Marjorie Greene

Ela é uma das seguidoras de Donald Trump que se mantém firme na revolta contra as medidas de controle da Covid.

Em vários países europeus, a violência dos protestos virou rotina.

Não é um problema fácil de resolver.

As plataformas digitais não encontraram ainda uma forma de conter narrativas que se espalham por uma infinidade de contas. Bloquear algumas dá satisfação à sociedade, mas não resolve.

A imprensa vê-se diante de um dilema: noticiar ou não as maluquices que vendem jornais e geram cliques. Mas influenciam pessoas vulneráveis, expostas a teorias sem fundamento e ilegais.

O espaço dado a Piers Corbyn por alguns veículos virou objeto de críticas.

Para a polícia, o dilema é o direito à livre expressão e manifestação.

No terceiro ano da Covid, controlar o negacionismo e o ativismo antivacina pode ser mais importante do que pesquisar novos tratamentos.


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