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sexta-feira, março 29, 2024

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O 100º aniversário de Clóvis Meira

O revisor aposentado Clóvis Meira, que atuou em diversas editoras e jornais de São Paulo, entre eles o Estadão, completou em 14/4 seu 100º aniversário junto a alguns amigos, parentes e vizinhos. Natural de Aracaju, ficou órfão de pai em 1918. Fez os estudos primários em sua cidade natal e como não pôde fazer um curso superior tornou-se autodidata. Em 1951, por motivos políticos, migrou para São Paulo, onde se radicou. É autor de As três faces de Lima Barreto (Scortecci, 1994) e deve lançar em breve Manuel Antônio de Almeida, desconhecido,  no qual revela fatos que passaram despercebidos pelos que escreveram sobre a curta existência do autor de Memórias de um sargento de milícias. Ele tem um terceiro já escrito, Perfis e lembranças, ainda sem previsão de lançamento, em que procura tirar do esquecimento fatos e figuras de relevo de nossa História política e literária como o próprio Lima Barreto, Borges da Fonseca, André Rebouças, Antônio Pedro de Figueiredo, Paula Brito, Artur Azevedo e Gustavo de Lacerda, entre outros. Presente à festa, Vera Moraes, que com ele trabalhou entre 1976 e 1977, diz que “aprendi com o Sr. Clóvis tudo que sei sobre a língua portuguesa no ano em que trabalhamos juntos no Estadão, e muito mais do que nos três anos de faculdade”. Outra amiga que convive com ele desde 1974, Nilcéia Cleide da Silva Baroncelli, enviou a J&Cia o depoimento a seguir: “No último domingo, 14 de abril, o jornalista sergipano Clóvis Mello Meira, radicado em São Paulo, completou cem anos. A família convidou alguns amigos para uma reunião, e tivemos o prazer de estar mais uma vez com nosso querido jornalista, em data tão especial e tão rara, mesmo nos dias de hoje. Clóvis Meira mora em São Paulo desde 1951, quando foi obrigado a deixar sua cidade natal, Aracaju, por motivos políticos. Pouco mais de ano e meio depois, enfrentou o empastelamento e fechamento do jornal Última Hora, de Samuel Wainer, naqueles dias de perseguição cerrada ao então presidente Getúlio Vargas, perseguição que culminou no suicídio e na comoção popular que tomou conta do País. Ele mesmo me contou que todos os jornalistas desse órgão, ele inclusive, tiveram de sair às escondidas, colados às paredes do prédio, enquanto lá fora a multidão ameaçadora os cercava. Testemunhou muitos outros eventos políticos, talvez até tenha sido personagem de algum, mas, não obstante a confiança que depositava em minha pessoa, a quem considerava como uma filha (como me disse muitas vezes), nunca entrou em detalhes sobre isso. Só uma vez, em que eu estava esboçando uma possível peça de teatro sobre acontecimentos que havia presenciado, ele teve uma reação fortemente emocionada. Eu escrevi que o personagem lia instruções, decorava e depois destruía o papel. Para mim, era puro efeito teatral. Mas ele, com a voz embargada, comentou: ‘Eu tive de fazer isso muitas vezes…’. Acredito que tenha sido sempre um devorador contumaz de livros de literatura brasileira. Seu conhecimento é vasto, e as observações que fez a respeito de alguns de seus autores favoritos, muito pertinentes e mesmo surpreendentes. Seu perfil de autodidata revela um agudo senso de observação e uma capacidade de atualização notável, o que demonstra que tudo o que se aprende por vontade própria permanece por mais tempo na memória. O interesse revelado pela literatura brasileira o levou a escrever dois livros. O primeiro, Três faces de Lima Barreto, escrito quando ele já contava mais de setenta anos, foi publicado em 1994, logo depois da perda de sua esposa, Dona Erosina Matos Meira. O segundo, escrito com mais de oitenta, é Manuel Antonio de Almeida, desconhecido. Tive oportunidade de ler os originais e me surpreendeu muito o desenvolvimento tão alentado de aspectos da história de vida e da obra do autor de Memórias de um sargento de milícias. Este, um livro que foge do enquadramento que se dá às escolas literárias, e ao qual se atribui a adjetivo ‘picaresco’, sempre divide opiniões. Neste trabalho, em vias de publicação, Clóvis Meira comenta inclusive a larga fortuna crítica que acompanhou o romance ao longo de suas várias edições, e os vários enfoques com que a crítica vê as produções literárias, o que me sugere que o livro de ‘seu’ Clóvis seja uma obra de literatura comparada quanto à crítica. Mesmo agora, aos cem anos, enxergando e ouvindo muito pouco, seu rosto guarda a mesma expressão de antes: discreta, mas com um brilho muito especial nos olhos. Com este brilho, ele nos recebeu no domingo. Talvez seja o jornalista mais idoso de São Paulo, talvez até do Brasil. Mas é ainda bem jovem. Por isso, se na próxima visita que lhe fizermos ele contar que escreveu ainda um outro livro, não vou me espantar. Pode ser, pode ser…”

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