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sexta-feira, março 29, 2024

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Trabalhadores da EBC denunciam novos casos de censura

EBC

Em carta publicada em 11/2, trabalhadores da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que reúne Agência Brasil, TV Brasil e Rádio Nacional, denunciaram novos episódios de censura e reafirmaram o caráter público da empresa.

O documento, aprovado em assembleia virtual pelos funcionários, pede para que os atuais gestores da empresa respeitem os objetivos e os princípios constitucionais da lei que a criou, que diz que a EBC deve ter “autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão”, algo que, segundo eles, não vem acontecendo.

O texto repudia a possível interferência do governo Bolsonaro no conteúdo publicado nas plataformas da empresa, que busca “camuflar e blindar o atual governo de quaisquer polêmicas”, evitando citar temas como “as incompetências administrativas de ministérios chefiados por militares, o desmatamento da Amazônia, o negacionismo científico sobre a Covid-19, além de ausência de cobertura humanizada, com histórias de perdas familiares relacionadas à pandemia”. A carta cita casos mais recentes, como a falta de oxigênio em Manaus e a primeira pessoa vacinada no Brasil, pautas que não puderam ser divulgadas pela empresa.

Os funcionários denunciam que tais interferências afetam significativamente o papel jornalístico da empresa: “Em alguns poucos casos, a insistência do profissional com a pauta rende uma matéria sobre esses temas, desde que não contenha críticas ao governo”. Os mecanismos de censura incluem atraso de horas na publicação de reportagens, conteúdos colocados no ar sem os metadados necessários para que eles apareçam em mecanismos de busca como o Google, perseguição a jornalistas, com direito a mudança compulsória de setor, entre outros.

A carta revela que “repórteres recebem pautas vexatórias ou absurdas, com destaques, enfoques e temas favoráveis ao governo ou que apenas promovem a imagem do presidente e de ministros de Estado. Vozes dissonantes – incluindo presidentes e autoridades dos Poderes Judiciário e Legislativo – são silenciadas. Jornalistas são constrangidos diariamente a ignorar assuntos relevantes do dia ou fazer uma abordagem superficial que não desagrade”.

Casos anteriores de censura

Essa não é a primeira vez que a EBC sofre com censura e interferência do governo atual. Em novembro de 2020, Carlos Alberto Vilhena, procurador federal dos Direitos do Cidadão, avaliou que pode caracterizar como ato de improbidade administrativa a saudação a Bolsonaro durante a transmissão do jogo entre Brasil e Peru na TV Brasil, em 13 de outubro. Ele citou o artigo 37 da Constituição Federal, que prevê que “atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverão ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, deles não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores público”.

Em setembro do ano passado, os trabalhadores da EBC, ao lado de sindicatos de jornalistas e da Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) divulgaram o 2º Dossiê Censura EBC, denunciando casos de interferência e propaganda do governo, algo que, segundo o documento, acontece desde 2016, mas foi agravado sob a gestão Bolsonaro.

E em novembro de 2019, jornalistas da EBC enviaram carta para a direção da emissora questionando a demora em noticiar o pronunciamento de Jair Bolsonaro sobre os desdobramentos da investigação do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes. O texto afirmou que a EBC publicou brevemente algo sobre o assunto cerca de 15 horas após a fala do presidente. Vale lembrar que em agosto do mesmo ano uma rápida exibição da imagem da vereadora assassinada em um programa da TV Brasil resultou na demissão do diretor da atração e na saída do programa da grade da emissora.

Leia a carta aberta dos funcionários da EBC na íntegra:

Carta aberta à sociedade brasileira em defesa da Empresa Brasil de Comunicação

Nós, trabalhadores da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), vimos por meio desta carta aberta reafirmar o caráter público da empresa e exigir que os atuais gestores RESPEITEM os objetivos e os princípios constitucionais da lei que criou a Empresa.

Em seu artigo 2º, parágrafo 8º, a Lei nº 11.652/2008, afirma que a empresa deve ter “autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão”, a base da comunicação pública.

A Lei da EBC foi aprovada para aplicar o artigo 223 da Constituição, que estabeleceu “o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal”.

Por lei, os veículos da EBC devem difundir e promover a cidadania, a diversidade e a pluralidade.

Não podemos servir de instrumento para propaganda e promoção pessoal de presidentes ou de governos, como tem sido atestado em inúmeros relatórios produzidos por seus empregados.

Ao longo de 2020, listamos grande volume de episódios de censura no 2º Dossiê de Censura e o relatório da Ouvidoria Cidadã da EBC, lançada em dezembro pela Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública, detalhou casos de governismo e desrespeito à lei em conteúdos veiculados.

A nova gestão altera o organograma e cria novos cargos para abrigar apaniguados.

Enquanto isso, a programação própria dos veículos da EBC é reduzida a quase nada e feita sem nenhum investimento. Não há mais incentivo para a produção independente. A empresa produz programas encomendados pela Esplanada e pelas Forças Armadas – que, inclusive, se regozijou premiando um deles, o Faróis do Brasil. Outra imoralidade é a injeção de dinheiro público em emissoras privadas. Saiu no jornal que a EBC negocia a compra de “Os dez mandamentos”, a novela bíblica da Record, para ser exibida na TV Brasil.

O próprio diretor-presidente da EBC, Glen Lopes Valente deu declarações que contrariam os princípios de comunicação pública previstos na lei. Em tom de comunicação institucional, sua fala foi publicada na Agência Brasil no dia 19 de novembro, na matéria “EBC participa do 10º Encontro de Gestão de Custos do Setor Público”: “Brinco que a gente tem um conglomerado de comunicação. A gente tem plataforma de rádio, televisão, internet e a gente está maximizando todas essas plataformas para fazer a comunicação de tudo que acontece no governo”.

São inúmeros os casos de interferência na pauta jornalística e na grade das emissoras de rádio ou da TV Brasil. Tivemos alterações profundas em programas que são patrimônio da TV pública, como o Sem Censura, há 35 anos no ar. Um marco por ampliar o debate na sociedade no pós-ditadura, o Sem Censura foi totalmente reformulado em 2020 e saiu da grade no fim do ano passado.

Registramos também a edição do programa Antenize para retirada de uma imagem de Marielle Franco; a censura ao Alto-Falante, da Rede Minas, que não foi ao ar por conter clipe de Arnaldo Antunes falando sobre milícia, autoritarismo, tortura e terraplanistas.

A diversidade, uma marca da TV Brasil, que já teve uma jornalista negra, Luciana Barreto, entre os seus âncoras, também sofre. Não se pode fazer qualquer menção ao público LGBTI.

Todos os esforços dessa gestão são contrários e desencorajadores da comunicação pública, assim como em igual medida buscam camuflar e blindar o atual governo de quaisquer polêmicas.

A empresa negligencia, ainda, a cobertura da pandemia de Covid-19, dando dados descontextualizados e não acompanhando a evolução da doença no Brasil. A TV Brasil ignorou a falta de oxigênio em Manaus e as Redes Sociais não puderam noticiar a primeira pessoa vacinada contra à Covid.

Outros assuntos sequer foram pautados, como as incompetências administrativas de ministérios chefiados por militares; o desmatamento da Amazônia; o negacionismo científico sobre a Covid-19; além de ausência de cobertura humanizada, com histórias de perdas familiares relacionadas à pandemia e demandas de movimentos sociais. Em alguns poucos casos, a insistência do profissional com a pauta rende uma matéria sobre esses temas, desde que não contenha críticas ao governo.

Censura e governismo

São utilizadas diferentes táticas de censura, como o atraso de horas na publicação de reportagens e conteúdos colocados no ar sem os metadados necessários para que eles apareçam em mecanismos de busca como o Google. Ou seja, as reportagens desaparecem.

O jornalismo é o alvo central de decisões autoritárias e colegas têm sofrido perseguição até com mudança compulsória de setor. Repórteres recebem pautas vexatórias ou absurdas, com destaques, enfoques e temas favoráveis ao governo ou que apenas promovem a imagem do presidente e de ministros de Estado.  Vozes dissonantes – incluindo presidentes e autoridades dos Poderes Judiciário e Legislativo – são silenciadas. Jornalistas são constrangidos diariamente a ignorar assuntos relevantes do dia ou fazer uma abordagem superficial que não desagrade.

Destacamos o vergonhoso episódio de transmissão da seleção brasileira de futebol, no qual o narrador saudou o presidente Bolsonaro. Além desse evento, há outros sem nenhuma relevância, como a participação do presidente em jogo beneficente, em infindáveis formaturas militares ou nos mais de 10 minutos em que Bolsonaro apareceu ao vivo acenando para carros em uma rodovia.

As redes sociais foram apropriadas para fazer propaganda governamental, com publicações coordenadas em todos perfis da casa de assuntos de interesse do governo – como a campanha do PIX – e com conteúdo sem nenhuma relação com as emissoras públicas Lembramos também o fim do perfil EBC na Rede e o apagamento de publicações antigas. Além de orientações de censura prévia, com a divulgação de lista de assuntos permitidos para publicação e o veto a assuntos “sensíveis”. Entre eles, o caso Beto Freitas, brutalmente assassinado no Carrefour em Porto Alegre, e matérias relacionadas à Pandemia da Covid-19.

Esses episódios poderiam ser caracterizados como crime contra o princípio constitucional da impessoalidade na administração pública, já que não é permitido o uso de meios de comunicação públicos ou estatais para promoção pessoal.

Ataques à EBC e a seus funcionários

Convivemos com a permanente ameaça de fechamento de emissoras históricas de rádios e a privatização da própria EBC.

RESSALTAMOS que extinguir a empresa deixaria órfãs 7 mil rádios por todo o país. As emissoras baixam conteúdo diariamente da Radioagência Nacional, que publica uma média de 80 matérias por dia para utilização gratuita. Também deixaria sem conteúdo qualificado um número incalculável de veículos pelo país que reproduzem fotos e notícias gratuitamente da Agência Brasil.

Em meio a uma pandemia que manteve as pessoas em casa, precisamos lembrar que a TV Brasil tem a maior programação infantil em canal aberto e um dos mais premiados programas de jornalismo da televisão brasileira: o Caminhos da Reportagem. A emissora também exibe shows e apresentações de artistas que não têm espaço nos canais privados.

Não poderíamos deixar de mencionar a necessidade de uma política de valorização profissional, como a aprovação do Plano de Cargos e Salários, do Acordo Coletivo de Trabalho para 2021 e a redução de jornada de 1 hora para as mães que amamentam – realidade em empresas públicas como a Embrapa, o Inep, tribunais superiores e o Congresso Nacional.

A luta pelo fim do chapa-branquismo

O pedido dos empregados e empregadas da EBC para 2021 é que possamos ser referência em jornalismo e voltar a fazer programas de rádio e de TV de excelência. Queremos ter orgulho de trabalhar na EBC e em todos os seus veículos e setores.

Convidamos, mais uma vez, o Ministério Público Federal (MPF) a cumprir a sua função de fiscalizar a Lei da EBC e o uso abusivo e reiterado dos veículos públicos para promoção pessoal do presidente da república, seus ministros e de seu projeto político.

Reiteramos: não servimos a interesses de governo, qualquer que seja ele, nem para promoção pessoal de figuras públicas ou proselitismo. Esse não é nosso papel e repudiamos a insistente interferência do governo federal nas redações da empresa. Assim como repudiamos e nos envergonhamos com a passividade de parte dos atuais gestores – concursados – que aceitam esse papel e pressionam colegas a se submeterem.

A EBC NÃO PERTENCE AO GOVERNO!  A EBC É DO POVO!

Entenda como funciona a EBC

A EBC é responsável por sete emissoras de rádio (Nacional FM Brasília; Nacional Brasília AM, Nacional Rio AM, Nacional Alto Solimões AM, Nacional da Amazônia, MEC FM Rio, MEC AM Rio) e duas retransmissoras (MEC AM Brasília e Nacional Alto Solimões FM), pela TV Brasil e produz, além do conteúdo jornalístico, programas de entretenimento e culturais.

A empresa responde também pela formação da Rede Nacional de Comunicação Pública (RNCP), atualmente consolidada com 33 emissoras de TV afiliadas e 11 de rádio.

Tem, ainda, duas agências públicas de notícias: a Agência Brasil e a Radioagência Nacional.

Por meio de contrato firmado com a Secretaria de Comunicação da Presidência da República, cabe à EBC Serviços produzir a TV Brasil Gov, A Voz do Brasil e gerenciar a Rede Nacional de Rádio, além de licenciar os programas dos veículos da EBC, fornece monitoramento e análise de mídias sociais e realiza todo o trabalho de publicidade legal para os órgãos federais.

Carta aprovada por unanimidade em assembleia pelos empregados e empregadas da EBC

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