Por Silvio Ribas

Aquela cena me encheu os olhos e jamais abandonou a minha mente. Após 50 minutos cruzando os ares do Atlântico Sul a bordo de um helicóptero ao estilo militar, avistei da janelinha, pipocando lá no horizonte, uma dúzia de labaredas esbeltas e bem afastadas umas das outras, brotando das ondas.

As tochas envoltas por neblina e avistadas após o desparecimento da costa eram a primeira parte visível das plataformas na Bacia de Campos, no norte fluminense, jogando luz sobre o futuro do Brasil. Meu destino ali era a mais nova delas, a P-18, até então maior estrutura semissubmersível do mundo.

À medida que ficava mais perto, a imagem da unidade ancorada no Campo de Marlim mudava, não só para desmentir terraplanistas mas também para descortinar o ousado salto tecnológico realizado por engenheiros brasileiros na exploração eficaz de petróleo e gás em águas ultraprofundas.

Era 22 de abril de 1994. Pelo Diário do Comércio, eu integrava a trupe de 22 repórteres da imprensa mineira convidados pela Petrobras a conhecer o trunfo na conquista das jazidas de hidrocarbonetos. Comigo estavam Jorge Fernando dos Santos (Estado de Minas) e Marili Ribeiro (Guarani FM).

Nosso tour de dia inteiro pelo complexo flutuante começou por Macaé (RJ), onde pernoitamos de véspera. Presenciamos logo o impacto dos negócios da petroleira na cidade que crescia loucamente, como base do transporte aéreo para as suas plataformas e ponto de apoio para as suas equipes.

Em 2010, o aeroporto de Macaé chegou a ser o 15º do País em movimento de aeronaves, superando os de Vitória, Florianópolis e Manaus, e o número um de helicópteros da América Latina, com 150 pousos e decolagens diários, puxados pelas atividades da Petrobras e seus fornecedores no mar.

Como navio de dois cascos de 43,9 metros de altura submergidos, as 12 mil toneladas de aço da P-18 usavam 15 mil toneladas de água como lastro. Suas tubulações pareciam refinaria e seus alojamentos, transatlântico. Ficamos tontos com oscilações no piso, só perceptíveis no líquido do copo.

Montada em Cingapura ao custo de US$ 272 milhões e com um convés de 5,1 mil metros quadrados, a P-18 atingiu em 1997 a capacidade máxima de 100 mil barris diários. Ela recebe óleo com água e gás extraído de 16 poços de até 1.030 metros de profundidade, separa-o e bombeia-o para a terra.

A visita ciceroneada por gente de macacão laranja encerrou com palestra numa cabine sobre a façanha brasileira na indústria petrolífera e a “cobiça das potências internacionais”, uma defesa do status quo estatal. Ganhamos de suvenir uma ampola de óleo bruto – surpreendentemente marrom.

Sequer sonhávamos que, 14 anos depois, Lula bradaria a descoberta das dezenas de bilhões de barris do pré-sal emergidas nas concessões privadas. Muito menos que o “bilhete premiado” levaria à mudança do marco regulatório e ao Petrolão, o escândalo bilionário que vitimou a Petrobras.


Labaredas em alto-mar
Silvio Ribas

A história desta semana é novamente uma colaboração de Silvio Ribas, assessor parlamentar do gabinete do senador Lasier Martins (Podemos-RS).

Nosso estoque do Memórias da Redação acabou. Se você tem alguma história de redação interessante para contar mande para [email protected].

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