Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

A frase não é minha. É o título de um artigo na Vanity Fair sobre as mudanças no Google que podem fazer o jornalismo sumir das buscas. O leitor apressado receberá sumários feitos com base no que gente de carne e osso pautou, mandou cobrir, apurou, escreveu, fotografou e editou (sem contar a turma da contabilidade, do RH, da TI, do marketing, do comercial, da fotografia e toda a cadeia produtiva de uma empresa jornalística).

O mecanismo está sendo visto por muitos como a pá de cal em um setor já abalado pela concentração da propaganda nas mãos das plataformas digitais.

Enquanto as empresas decidem se brigam na justiça contra o uso de seu conteúdo para treinar as IAs ou se negociam com as dominantes do setor para receber compensação e a nova forma de encontrar notícias parece inexorável, a tecnologia avança nas redações.

Mas o que pensa o consumidor de notícias? O Instituto Reuters pesquisou as impressões do público a respeito do uso da IA na produção jornalística.

Foram ouvidas mais de 12 mil pessoas em EUA, Japão, França, Reino Unido, Argentina e Dinamarca. Em sua maioria, elas demonstraram reservas com a IA no jornalismo e esperam que humanos estejam no comando.

Um em cada três entrevistados acreditam que editores de carne e osso confirmam se os resultados gerados pelas IAs estão corretos e obedecem a altos padrões antes de os publicar.

Isso nem sempre é verdade. Em dezembro do ano passado, o CEO do grupo dono da Sports Illustrated foi demitido depois da revelação de que matérias  geradas por IA − como resultado de acordo comercial com uma empresa de conteúdo patrocinado − tinham sido assinadas por jornalistas reais. Mas eram todas inventados pela IA, o que faz com que o conteúdo esteja longe do “alto padrão”.

Os pesquisadores constataram muita incerteza a respeito da absorção da IA generativa na produção jornalística.

Uma parte do público nesses países já entende que a IA já está entre nós: 43% acreditam que é sendo usada sempre ou com muita frequência para corrigir ortografia; 29% para escrever manchetes e 27% para escrever textos.

Apenas 5% acham que não é necessário rotular conteúdos produzidos com ajuda da IA. Mas o que rotular?

Um terço dos pesquisados entende que se a IA ajudou a corrigir erros ortográficos ou criar uma manchete, isso deve ser sinalizado. A taxa sobe para usos mais avançados, como “escrever o texto” e “analisar dados” (ambos marcando 47%). E nem tudo é aceitável.

Em uma escala resultante da ponderação de opiniões negativas e positivas, notícias sobre moda alcançaram sete pontos, enquanto textos sobre esportes marcaram cinco. Já em notícias politicas a pontuação foi -33.

Por ter popularizado a IA generativa, o ChatGPT é a ferramenta mais utilizada pelo público. Mas para a obtenção de notícias o uso ainda é baixo (5%), o que se explica pelo fato de o serviço da OpenAI não estar conectado ao noticiário recente.

No entanto, vale observar o que acontece nos EUA, onde o Google começou a testar as buscas de sua IA abrangendo conteúdo jornalístico: 10% dos entrevistados pelo Reuters disseram já usar a tecnologia para se informar. Mais do que confiança no conteúdo, o que está em jogo agora é acesso.

Grandes empresas jornalísticas fecharam acordos com a OpenAI para licenciar seus conteúdos − Financial Times, Axel Springer, Le Monde, Prisa, NewsCorp, Vox, The Atlantic −, seguindo os passos da Associated Press, a pioneira.

New York Times, Getty Images e o grupo que edita o Chicago Tribune levaram a briga aos tribunais, o que pode resultar em acordos financeiros mais vantajosos do que obteriam negociando diretamente, ajudando a capitalizar o setor.

As questões em aberto são: será que o dinheiro dos acordos, por mais que as empresas de IA abram suas carteiras, compensará a queda de tráfego vaticinada por analistas quando os links diretos sumirem das buscas? E os pequenos, alijados desses acordos?

Se a audiência despencar, como atrair anunciantes? O que acontecerá com a receita da programática? A injeção das gigantes será suficiente para manter a produção de conteúdo capaz de continuar alimentando a “fera” da IA?

Nick Bilton, da Vanity Fair, levantou algumas dessas perguntas, mas não deu as respostas, se é que alguém as têm.


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