Por Álvaro Bufarah (*)

O mercado global da música atingiu a marca de US$ 36,2 bilhões em 2024, registrando um crescimento de 6,5% em relação ao ano anterior, segundo dados do relatório anual da consultoria MIDiA Research. O desempenho positivo mantém a tendência de recuperação e adaptação da indústria em meio a um cenário global ainda desafiador, marcado por instabilidades econômicas, inflação persistente, juros altos e mudanças no comportamento de consumo.

Quando excluídos os chamados “direitos expandidos” − como merchandising, licenciamento e experiências −, a receita do setor ficou em US$ 32,1 bilhões. O crescimento, embora abaixo dos 9,4% registrados em 2023, reflete a capacidade do setor de se adaptar a transformações econômicas e tecnológicas que vêm redesenhando a cadeia produtiva da música.

O streaming digital segue como principal fonte de receita do mercado, mas deu sinais de desaceleração. Pela primeira vez, sua participação na receita total caiu levemente, passando de 61,5% em 2023 para 61,3% em 2024, mesmo com um faturamento expressivo de US$ 22,2 bilhões. A contribuição do streaming para o crescimento global foi mais de 20% inferior à registrada em 2022. Especialistas apontam que o modelo de negócios do streaming está se aproximando da maturidade e que os recentes reajustes de preços e tentativas de introdução de planos superpremium ainda não compensam a desaceleração natural do setor.

O segmento físico, por sua vez, voltou a apresentar retração − queda de 4,8% −, mantendo um comportamento cíclico de crescimento e queda observado ao longo da década. O avanço da indústria em 2024 teve impulso significativo de outras fontes de receita, como sincronização (uso de músicas em filmes, séries e publicidade), direitos de performance pública e os já mencionados direitos expandidos. Este último segmento somou US$ 4,1 bilhões, evidenciando o sucesso das gravadoras em monetizar o engajamento dos fãs com produtos e experiências além da música.

As receitas provenientes dessas categorias cresceram 17,3%, sendo que a Sony Music foi a grande destaque, ao registrar um salto de 38,6% nas receitas de “outros”. No ranking geral, o Universal Music Group (UMG) manteve sua posição como a maior gravadora do mundo, com receita de US$ 10,5 bilhões. No entanto, o Sony Music Group (SMG) foi o que mais cresceu entre os grandes, com alta de 10,2% em 2024, ampliando sua participação de mercado em 700 pontos-base, alcançando 21,7%. Desde 2020, o SMG acumulou um crescimento de 73,9%.

As gravadoras independentes também ampliaram sua participação e chegaram a representar 29,6% do mercado. Já os artistas independentes, que lançam suas músicas diretamente nas plataformas − conhecidos como Artists Direct − movimentaram US$ 2 bilhões em 2024. Apesar de o número de artistas nesse perfil ter crescido 17,2%, alcançando 8,2 milhões de criadores, sua receita ficou abaixo da média do mercado. Serviços chineses como Tencent Music e NetEase destacaram-se por impulsionar esse crescimento na Ásia.

O relatório aponta ainda uma tendência preocupante: a crescente distância entre o crescimento das plataformas de streaming (DSPs) e o das gravadoras e detentores de direitos autorais. Em 2024, as DSPs aumentaram sua receita em um ritmo três vezes maior do que as gravadoras, tendência que já dura três anos. Esses serviços estão diversificando suas fontes de receita por meio da oferta de conteúdos como podcasts, audiolivros, músicas mais baratas oriundas de bibliotecas de produção, inteligência artificial generativa e novos modelos de licenciamento. Algumas plataformas, como o Spotify, ainda passaram a cobrar das gravadoras pelo acesso promocional aos seus algoritmos, como no caso do “Modo Descoberta”.

Embora os números gerais sejam positivos, o relatório traz um alerta importante: a indústria precisa rever suas estratégias diante do avanço das plataformas e da movimentação crescente de artistas independentes que buscam novas formas de distribuição fora dos grandes serviços de streaming. O risco, segundo os analistas, é que parte significativa da cultura musical do futuro seja criada e consolidada em ambientes que fogem ao controle tradicional das grandes gravadoras.


Álvaro Bufarah

Você pode ler e ouvir este e outros conteúdos na íntegra no RadioFrequencia, um blog que teve início como uma coluna semanal na newsletter Jornalistas&Cia para tratar sobre temas da rádio e mídia sonora. As entrevistas também podem ser ouvidas em formato de podcast neste link.

(*) Jornalista e professor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e do Mackenzie, pesquisador do tema, integra um grupo criado pela Intercom com outros cem professores de várias universidades e regiões do País. Ao longo da carreira, dedicou quase duas décadas ao rádio, em emissoras como CBN, EBC e Globo.

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