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sábado, outubro 12, 2024

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Memórias da Redação ? Com as larvas no cangote

Com o estoque recomposto por diversos leitores que atenderam aos nossos apelos, esta semana publicamos nova história de Luiz Roberto de Souza Queiroz, o Bebeto ([email protected]), um de nossos mais assíduos colaboradores, ex-Estadão e que hoje atua com sua própria empresa de produção de conteúdo. Com as larvas no cangote             Quando o Estadão me mandou fazer uma reportagem no Centro de Primatologia do Rio de Janeiro, em Guapimirim, onde estava sendo reproduzido o macaco-barrigudo que também respondia pelo nome de muriqui, o biólogo Alcides Picinatti, que dirigia a instituição, me pediu que levasse para o Zoológico de São Paulo alguns tenébrios para serem criados.             O tenébrio é uma larva de uns três centímetros, que se alimenta de farelo de trigo, e embora atualmente seja vendido à vontade para pescadores que precisam de isca viva, naquele tempo (década de 1980) era um alimento raro e importante para mico-leão, sagui-de-bigode e outros primatas ameaçados. O diretor do Zoo, Mário Autuori, que me contratara como assessor de imprensa, precisava dos insetos e do know how para criá-los.             Recebi uma latinha com farelo de trigo e umas duas dúzias das larvinhas que, para não morrerem no calor da Dutra, dentro do Fiat sem ar condicionado da Táta Gago Coutinho, seguiram viagem com a lata aberta, para terem ventilação.             Depois de duas horas de estrada alguns tenébrios mais ousados deixaram a lata, subiram pelo encosto do banco e impressionados, como eu mesmo, pelo lindo pescoço da Táta – cangote, como se diz no interior –, resolveram passear por ali.             A reação foi a esperada. O carro zigzagueou pela pista, parou no acostamento, ela saiu furiosa, jogando os bichinhos para todo lado e eu tive que implorar para que não me deixasse… com os tenébrios, no meio da estrada.             Os tenébrios se adaptaram bem ao Zoo e, como só pensavam naquilo, se multiplicaram aos milhares, alimentando gerações e gerações de macacos. A história teve final feliz, mas como assessor de imprensa do Zoo tive problemas com a Táta também por causa do megalobulimus, o caramujo de quase um palmo que foi comum nos cafezais paulistas de antanho. O roteiro é quase o mesmo: fui fazer uma matéria como bichologista do Estadão – como diziam na redação – e o biólogo, que se não me engano criava cobra-do-milho vinda dos Estados Unidos, me pediu para ser o portador de dois caramujões, certamente benvindos à coleção do Zoológico. Cheguei a São Paulo num sábado à noite e, com o Zoo fechado, deixei as lesmas com algumas folhas de alface, no meu banheiro do apartamento de Moema. Bem alimentados, os bichos exploraram o ambiente, caminhando por todo o banheiro e deixando o tradicional rastro de gosma brilhante por todo o solo e as paredes azulejadas. Até achei bonito, o rastro do caramujo é iridescente e os bichos demonstraram sapiência, porque, como perdiam água junto com o muco que deixavam na parede, foram se hidratar no box do chuveiro. Apesar das minhas constatações científicas, fui expulso de casa com os caramujos, e isso depois de lavar o banheiro, tarefa a que não estou afeito. As descobertas “científicas” do Zoológico das quais participei foram muitas, como a que surgiu por causa de uma briga com o Tribunal de Contas, que não aceitava a despesa com escargot francês, glosou as notas, dizendo que era mordomia. Na realidade não era. O Zoo recebera uns lagartos cuja dieta era o caramujo que transmite a esquistossomose, que, é claro, não havia no Zoo. Comprados os caramujos franceses (escargot), os lagartos aceitaram a dieta importada e sofisticada, mas ficava caro e havia o problema com o Tribunal. Meu orgulho é ter participado da única tentativa bem-sucedida de “falsificar” o escargot. Pegávamos as conchas do caramujo, recheávamos com pedacinhos de filé de sardinha e os lagartos, que certamente não eram bons gourmets, por vários anos se alimentaram do pitéu falsificado.

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