Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

O título de uma reportagem na Bloomberg Law sobre uma nova pesquisa global da KPMG não deixa dúvidas sobre os riscos que rondam a adesão do mundo corporativo aos compromissos ESG: “Estudo da KPMG revela planos surpreendentes para investimentos ESG por empresas”.

Segundo a consultoria, cerca de 90% das empresas pesquisadas planejam aumentar seus investimentos nos próximos três anos, a despeito do movimento anti-ESG que ganhou força sobretudo nos EUA.

A pesquisa envolveu 550 membros de conselhos, executivos e gestores de companhias com receita superior a US$ 1 bilhão, principalmente dos EUA e Europa.

Os resultados surpreenderam a Bloomberg porque parecem estar na contramão do mau humor dos investidores incomodados com a aplicação de recursos em projetos sociais e ambientais, que na opinião de uma parte cada vez maior deles não dão retorno financeiro.

À primeira vista, investimentos em processos mais sustentáveis − muitas vezes mais caros −, em mitigação de impacto de operações nas comunidades e em diversidade podem não dar retorno imediato. Mas a conta não é tão simples, se feita sob a perspectiva da reputação e dos riscos oferecidos ao negócio quando ela está em jogo.

ESG, reputação e lucros

Boicotes a marcas, pressão contra novos empreendimentos e até dificuldade de recrutar profissionais que preferem não se associar a empresas poluidoras, por exemplo, estão entre os riscos que vão muito além de notícias desfavoráveis na imprensa ou posts isolados nas redes.

Em um mundo que não existe mais, não era raro ouvir líderes empresariais na mesa do grupo de crises defendendo a ideia de que as más notícias sobre um problema seriam esquecidas em breve. E eles não estavam totalmente errados.

Apesar de todos os problemas atribuídos às redes sociais, é inegável que elas deram voz à sociedade, que não depende mais somente de uma imprensa sobrecarregada e pressionada pelo escândalo novo do dia ao ponto de não conseguir acompanhar todas as histórias até o fim.

O estudo da KPMG é um bom sinal de que líderes não estão embarcando totalmente na tese de que ESG não é relevante para o negócio. Mas não se pode deixar de considerar a hipótese de que uma coisa é o que se diz, e outra é o que se faz.

A consultoria mapeou as intenções, que podem não se concretizar na prática. Os dois principais desafios, apontados por 44% dos entrevistados, são recursos insuficientes e dificuldades de colaboração interna.

A comunicação entre departamentos e os “grupos isolados” dentro da organização foram citados como barreiras ao ESG por 41% dos líderes.

Uma curiosidade destacada pela KPMG é o método ainda pouco avançado de coletar e gerenciar os resultados: quase a metade das empresas consultadas ainda usa planilhas, mas 58% pretendem adotar a inteligência artificial para reunir dados.

“Fadiga ESG” nas empresas menores 

Ao mesmo tempo, outro novo estudo mostra que a realidade em empresas menores pode ser diferente. A consultoria britânica de ESG Sifa Strategy entrevistou 31 membros de conselhos de administração de 70 empresas do Reino Unido para compreender a situação em companhias pequenas e médias, em um momento que a análise chamou de “encruzilhada”.

Apenas 43% dos conselheiros acham que o ESG está alinhado às expectativas de retorno dos acionistas, percentual que vem caindo desde que a investigação começou a ser feita, em 2021.

Uma percepção destacada no relatório é a de que as ações são muitas vezes implementadas apenas para “cumprir tabela” ou para atender a demandas regulatórias, e não como uma forma de adicionar valor à estratégia corporativa e às operações.

A visão “desanimada” é atribuída em parte ao cenário macroeconômico, que leva líderes e investidores a abordagens de curto prazo, embora não tenham tirado as três letrinhas da agenda.

E uma conclusão que emergiu das conversas é a de que a sigla ESG está desgastada. Vários entrevistados defenderam que ela devia ser revista, pois é vaga, significa coisas diferentes dependendo do ponto de vista, e olhar para os três pilares ao mesmo tempo nem sempre é fácil.

Os estudos completos podem ser visto aqui (KPMG) e aqui (Sifa Strategy).


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