Por Victor Félix
A cerca de 100 km da capital Natal, no Rio Grande do Norte, fica São Miguel do Gostoso, uma cidade predominantemente turística com pouco mais de dez mil habitantes, que recebe seus visitantes com uma culinária excelente, praias belíssimas, e muito vento. E em meio a tantas atrações turísticas está o grande point de arte da cidade, a Galeria Sol da Meia Noite, primeira e maior iniciativa de arte de São Miguel do Gostoso. O responsável pela galeria é um jornalista, que também se tornou artista plástico.
Filho de uma família precursora na cidade, de várias gerações, Emanuel Neri fez carreira como jornalista em São Paulo, mas nunca cortou laços com sua cidade natal. Ao contrário: dividia-se entre a capital paulista e a cidadezinha turística do Rio Grande do Norte.
Ele iniciou a carreira na Tribuna do Norte, mas viveu a maior parte da vida profissional em São Paulo. Trabalhou em Estadão, Veja, teve breve passagem pela Bandeirantes e atuou na Folha de S.Paulo, veículo no qual mais tempo ficou, por quatro anos em uma primeira passagem e cerca de 14 na segunda. Depois, passou a atuar em comunicação corporativa, na Telefônica.
“Tenho uma relação afetiva com São Miguel do Gostoso, de muito afeto e carinho”, conta Emanuel. “Sou daqui e, embora grande parte da minha vida eu tenha morado em São Paulo, sempre vim a São Miguel, passava férias aqui. Tenho uma identificação muito grande. Gosto de mesclar natureza e urbano. São Miguel, que tem uma integração com a natureza muito extensa, e São Paulo, um lugar mais cosmopolita, como qualquer cidade grande”.
Mas a relação e o interesse pela arte sempre existiram. Emanuel gosta de colecionar obras. Em suas viagens pelo Brasil e pelo exterior, seu principal foco de curiosidade sempre foi arte, as galerias, os museus. E foi com este interesse que criou, em novembro de 2021, a Galeria Sol da Meia Noite (Av. dos Arrecifes, 2.454 – Bairro do Maceió), bancada com seus próprios recursos, a maior de São Miguel do Gostoso, e a primeira desse tamanho e proporções.
Para o jornalista, a iniciativa é um presente a São Miguel do Gostoso, uma forma de retribuir tudo o que a cidade e a comunidade lhe deram, e também contribuir para o turismo e a cultura local. Segundo ele, o nome Sol da Meia Noite trabalha com o místico, o mágico: “O sol do meio-dia, todos nós conhecemos. Mas o sol da meia noite ninguém conhece. Então, a ideia é o sol imaginário, que você apela para a imaginação, para a magia. À noite, na galeria, trabalhamos com a iluminação dos espaços, o paisagismo. A galeria Sol da Meia Noite é aquela magia de descobrir um sol à meia noite, desconhecido”.
Na galeria, são expostas obras não só de artistas de São Miguel, mas de outras partes do Brasil e também do exterior. Ela tem muitas obras externas, e um espaço grande, de cerca 10 mil m2, na beira da praia. O local tornou-se ponto de curiosidade, de reunião de cultura e arte. A galeria também trabalha com jovens em oficinas, estimulando o conhecimento e o interesse por arte.
Além do espaço externo, há também um pavilhão, onde ficam obras que não podem ser expostas a céu aberto. Cerca de 60 obras deste pavilhão interno, na exposição atual, são da coleção particular de Emanuel. E ele, que também é artista plástico, tem obras de sua autoria expostas no local.
Para o criador da galeria, a iniciativa é uma referência de arte em São Miguel do Gostoso, que acaba se tornando parte do turismo local, incentivando a própria comunidade e turistas para visitar a cidade, conhecer a arte local e de outras partes do Brasil e do mundo, com as obras da galeria.
“São Miguel do Gostoso é uma cidade pequena do litoral do Nordeste, carente de tudo. Na hora que você traz uma galeria do porte da Sol da Meia Noite para cá, ela acaba virando uma referência de arte”, diz Emanuel. “As pessoas que vêm a São Miguel, encontram belas praias para frequentar, ótimos restaurantes, bares e cafés. A gastronomia da cidade é excelente, mas essas pessoas terão também um excelente equipamento, espaço de arte. Dez mil metros quadrados, com muitas obras de artistas locais, de outras partes do Brasil e internacionais espalhadas por toda esta área. E também serve como referência forte de cultura/arte para a própria comunidade, e incentiva as pessoas de fora a conhecerem um pouco da arte local”.
Embora a arte como um todo no Brasil seja desvalorizada em um contexto geral, Emanuel se diz otimista. Ele acredita que, a cada dia, um novo talento está surgindo, e que a arte tem o poder de transformar: “A arte é um elemento muito importante na cultura de qualquer nação do mundo, e acho que a arte transforma. Ela transforma a vida das pessoas, e entendo que ela me transformou, mudou a minha vida. O jornalismo, minha profissão, também mudou a minha vida, mas a arte me ajudou muito a ter um olhar diferente sobre o mundo, a arte foi um vetor muito importante para isso”.
Neste sábado (23/7), a Sol da Meia Noite inaugura a exposição de fotografia Pretas, Pretinhos, Pretos, Pretinhas, uma ação afirmativa pelo orgulho negro e contra o preconceito racial. O fotógrafo Rubens dos Anjos fotografou negros e negras de São Miguel do Gostoso e de fora, crianças e adultos, que têm orgulho de mostrar sua cara e sua cor, de se deixarem fotografar. A exposição durará de dois a três meses. A galeria funciona todos os dias, com exceção de segunda-feira, das 18h às 21 horas.
Mas esta não é a primeira contribuição para a cultura e para o turismo local de Emanuel. Ele foi também fundador da segunda pousada de São Miguel do Gostoso, a Pousada dos Ponteiros. Em seu livro Latitude 5, o jornalista e artista plástico escreveu sobre o turismo da cidade, usando como fio condutor Leonardo Godoy, precursor no assunto, fundador da primeira pousada, Pousada do Gostoso, e do primeiro restaurante da cidade, o Latitude 5, que deu nome ao livro. Emanuel escreveu também Cabeças do Vento, sobre pessoas originárias de um local com muito vento, no caso, São Miguel do Gostoso. A obra mostra a história de famílias, incluindo a do próprio Emanuel, e de pessoas precursoras da cidade.