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segunda-feira, novembro 4, 2024

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Nexta, o canal via Telegram que desafia a censura na Bielorrúsia

Por Luciana Gurgel, especial para o J&Cia

Luciana Gurgel

A nova edição da pesquisa anual do Ofcom (órgão regulador das telecomunicações no Reino Unido) sobre consumo de notícias apontou declínio de 49% para 45% na quantidade de pessoas informando-se via redes sociais no país. E reconfirmou a baixa confiança nelas em comparação aos canais tradicionais de informação.

O estudo indicou que as redes mais populares para notícias entre os britânicos são Facebook (76%), Twitter (37%), Instagram (31%), WhatsApp (30%), Snapchat (17%) e LinkedIn (10%).

Isso não é, no entanto, uma realidade global. O exemplo na Bieolorrússia, tomada por protestos contra a reeleição do presidente Aleksandr Lukashenko, está demonstrando como uma rede social pode ser usada para informar e mobilizar um país inteiro, contornando a censura estatal.

O curioso é que a rede em questão não é uma das que costumam figurar como líderes de acesso, e sim o aplicativo de mensagens Telegram. Nele roda o Nexta, um canal criptografado baseado na Polônia,  que aproveitou a característica de transmissão segura de informações sob anonimato para se transformar na principal fonte de noticias no país desde que a conexão de internet foi severamente interrompida após as eleições de 9 de agosto.

O Nexta surgiu no YouTube há cinco anos, criado pelo então adolescente Stepan Putilo, para veicular paródias musicais de cunho político. Hoje são três canais − Nexta, Nexta Live e Luxta − que viraram uma poderosa máquina. A crise política ajudou a elevar o número de seguidores de 300 mil no início de agosto para mais de dois milhões. Não é pouco em um país com cerca de dez milhões de habitantes.

Organização de mídia do Século 21 − Em entrevista ao Euronews, Roman Potasetich, editor-chefe do Nexta, de 25 anos, descreveu o canal como “uma organização de mídia descentralizada do século 21, usando vários sites, sem um site ou página central”.

Nexta significa “alguém” no idioma local. Segundo Potasetich, o nome reflete a ideia de uma rede de milhares de bielorrussos compartilhando noticias, contando histórias que não seriam veiculadas na mídia estatal ou mesmo em veículos independentes, por temor de represálias. Ele assegura receber documentos e informações de dentro do próprio governo, transmitidos por funcionários de alto escalão insatisfeitos com os rumos políticos.

Não é só. O canal tornou-se uma ferramenta de mobilização para os protestos. Compartilha mapas mostrando onde a polícia está, indica locais para manifestantes se refugiarem, faz contatos com ativistas e advogados especializados em direitos humanos e orienta sobre como contornar os bloqueios da internet impostos pelo governo.

O Nexta, no entanto, não é uma unanimidade. Há questionamentos sobre a confiabilidade do conteúdo − fornecido pelos seguidores e não por jornalistas profissionais − e sobre quem financiaria suas operações.

De qualquer forma, ele coloca em evidência o valor das mídias sociais, tão criticadas por serem território fértil para a proliferação de fake news, como meio de expressão em sociedades onde não há liberdade de imprensa. A Bielorússia ocupa a 153ª posição no ranking da organização Repórteres Sem Fronteiras, que classifica o grau de liberdade em 180 nações.

Segundo reportagem do Voice Of America, dezenas de jornalistas foram detidos, agredidos e até  deportados desde as eleições − o sindicato contabiliza mais de 80 violações. A candidata de oposição, Svetlana Tikhanovskaya, que teria de fato vencido o pleito, candidatou-se depois que o marido, Sergei Tikhanovsky, um popular blogueiro popular, foi preso.

Não se sabe como a história política vai acabar. Mas o canal mostrou o caminho das pedras para driblar barreiras usando a tecnologia, virando um exemplo do ciberjornalismo. E pode inspirar outros países que também vivem o drama da censura governamental, ainda que sem os filtros editoriais e garantias legais de uma imprensa livre de qualidade.

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