Por Assis Ângelo
Eu falo o que falo porque poucos falam assuntos que tais.
Bom seria que tal tema fosse mais vezes abordado nas páginas de livros, jornais e revistas.
Bichinhos domésticos há muito são carinhosamente criados por homens, mulheres e crianças. Principalmente crianças.
Eu ia dizendo e agora concluo que a menina que mandou de presente um gatinho para o velho e bom Machado ficou pra lá de feliz quando dele, do gato, recebeu uma delicada cartinha. Dizia:
“D. Alba, Só agora posso pegar na pena e escrever-lhe para agradecer o obséquio que me fez mandando-me de presente ao velho amigo Machado. No primeiro dia, não pude conhecer bem este cavalheiro; ele buscava-me com palavrinhas doces e estalinhos, mas eu fugia-lhe com medo e metia-me pelos cantos ou embaixo dos aparadores. No segundo dia, já me aproximava, mas ainda cauteloso. Agora, corro para ele sem receio, trepo-lhe aos joelhos e às costas, ele coça-me, diz-me graças, e, se não mia como eu, é porque lhe custa, mas espero que chegue até lá.
Só não consente que eu trepe à mesa, quando ele almoça ou janta, mas conserva-me nos joelhos e eu puxo-lhe os cordões do pijama. A minha vida é alegre. Bebo leite, caldo de feijão e de sopa, com arroz, e já provei alguns pedaços de carne. A carne é boa; não creio, porém, que valha a de um camundongo, mas camundongo é que não há aqui, por mais que os procure. Creio que desconfiaram que há mouro na costa, e fugiram. Quando virá ver-me? Eu não me canso de ouvir ao Machado que a senhora é muito bonita, muito meiga, muito graciosa, o encanto de seus pais. E seus pais, como vão? Já terão descido de Petrópolis? Dê-lhes lembranças minhas, e não esqueças este jovem… Gatinho preto.”
E não podemos esquecer que o gatinho em questão era de cor preta.
Muitos poetas e romancistas, cronistas e contistas, também, escreveram sobre gatos. Pretos inclusive.
Quem não se lembra do conto O Gato Preto, de Edgar Allan Poe (1809-1849)?

De qualquer modo, não custa refrescar a memória: o protagonista, um jovem amante de animais domésticos, casou-se com uma garota que também amava gatinhos, cachorros etc. Numa hora qualquer, o cara perde as estribeiras e cega um dos seus gatos. A história segue e termina em terrível tragédia.
Poe, como tantas e tantos autores nacionais e estrangeiros, também gostava de gatos e gatas. Sua mulher, Virgínia, adorava Catterina.
Era uma gatinha e tanto, Catterina…
O nosso pernambucano Nelson Rodrigues foi um entre os 11 filhos de seus pais. Cresceu achando que um dia poderia ficar cego. Essa crença lhe veio depois que seus olhos viram um moleque de uns 9 anos cegando um passarinho.
O tempo passou e ele se casou três vezes. A segunda mulher, Lúcia, deu-lhe uma menina que nasceu cega. Por pouco ele não enlouqueceu. Anos depois, num livro de memórias, Nelson conta essa tristeza sob o título A Menina Sem Estrela (1967). Lá pras tantas, lembra:
“Uma noite, Lúcia foi internada, às pressas, na Casa de Saúde São José. Parto prematuro….
Tudo aconteceu numa progressão implacável. Daniela nasceu e não queria respirar… Mudaram o sangue da garotinha. E ela sobreviveu.
Lúcia quis ver a filha no dia seguinte. E veio numa cadeira de rodas… Voltou chorando, e dilacerada de felicidade. Também fui espiar Daniela pelo vidro do berçário. Uma enfermeira aparece e me pergunta, risonhamente: ‘O senhor é o avô?’. Respondi, vermelhíssimo: ‘Mais ou menos’. Mais uma semana, Lúcia e Daniele vinham para casa. Tão miudinha a garota, meu Deus, que cabia numa caixa de sapatos.
Dois meses depois, Dr. Abreu Fialho passa na minha casa. Viu minha filha, fez todos os exames. Meia hora depois, descemos juntos. Ele estava de carro e eu ia para a TV Rio; ofereceu-se para levar-me ao posto 6. No caminho, foi muito delicado, teve muito tato. Sua compaixão era quase imperceptível. Mas disse tudo. Minha filha era cega.”
O tema gato também não passou batido em Nelson Rodrigues. É dele uma pequena história a que intitulou O Gato Cego. Nesse conto, curtíssimo, ele fala de um jovem que encontrou dificuldade para escolher a profissão que deveria seguir. Os pais queriam que fosse psicólogo. Optou por Veterinária.
Um dia, bateu à porta do consultório uma mulher dizendo-se arrependidíssima por ter cegado um gato preto.
Ao ouvir o que ouviu, o jovem profissional partiu pra cima da mulher e fez com ela o que ela fez com o gato.
Baixa o pano.
O gato de Edgar Allan Poe lutou pra se salvar. Não conseguiu.
O gato de Nelson Rodrigues vingou-se da dona que o cegou.
Agora tem um gato de Stephen King que apronta loucuras inimagináveis. Chegou a uma casa como quem não quer nada. Manhosamente foi mostrando suas garras. Primeiro, matou uma mulher. Depois, outra. E, depois, o cara que cuidava da casa. Foi uma morte bárbara: atirou-se ao rosto da vítima, furando-lhe os olhos.
Refiro-me ao conto O Gato do Inferno.
Tudo isso ao contrário do que bem fazia o gato da menina Alice no País das Maravilhas.

Os gatos, como as pessoas, só são iguais no DNA. Tem uns que andam se balançando, outros que, além de andarem se balançando, miam charmosamente chamando para si a atenção de homens, mulheres e crianças. São vaidosos, não é Fausto Bergocce?
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