Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

A bravura de uma jornalista afegã acaba de ser reconhecida pela revista Time, que incluiu Zhara Joya, de apenas 29 anos, na lista das 12 Mulheres do Ano de 2022.

Ela enfrentou o extremismo do Talibã duas vezes. Na primeira, teve que se vestir de menino para estudar. Na segunda, exilou-se em Londres e daqui continua comandando seu site com notícias sobre a situação das mulheres afegãs, em um país onde o jornalismo foi dizimado.

É uma boa notícia que não compensa outras não tão boas assim nesta semana em que se comemora o Dia Internacional da Mulher.

A quantidade de mulheres jornalistas processadas, presas ou objeto de assédio online e offline cresce sem parar.

A Federação Internacional de Jornalistas publicou o resultado de duas pesquisas, feitas entre membros de sindicatos afiliados e profissionais de redação, constatando que há um longo caminho a percorrer para solucionar o problema do abuso online − e cobrou das empresas jornalísticas mais engajamento.

Enquanto isso, a ascensão profissional continua sendo uma barreira difícil de transpor.

O levantamento anual do Instituto Reuters para Estudos do Jornalismo deste ano mostrou queda de 1 ponto percentual na quantidade de mulheres como editoras principais nos veículos de maior circulação e audiência em vários países, incluindo o Brasil.

Apenas 21% dos 179 líderes nas 240 redações pesquisadas são mulheres, apesar de, em média, 40% dos jornalistas serem do sexo feminino, segundo o Reuters.

Em 11 dos 12 países pesquisados pelo instituto, homens mandam em mais da metade da grande mídia.

O Brasil foi um dos países que andou para trás. Jornalistas mulheres ocupavam 12% dos cargos de chefia há um ano, e agora detêm 7%.

Os resultados mostram que o acesso ao topo da cadeia de comando continua desigual, prejudicando carreiras.

Para a sociedade, o efeito é um noticiário editado majoritariamente por homens, sem as experiências de vida das jornalistas mulheres.

Isso não quer dizer que homens não tenham sensibilidade para tratar de questões que envolvem mulheres. Mas o equilíbrio de visões em decisões editoriais ajuda a oferecer ao público uma cobertura plural.

Os pesquisadores do Reuters afirmam que o ‘quem’ da frase ‘quem decide o que será notícia’ importa tanto na prática quanto simbolicamente.

“As pessoas que ocupam cargos de liderança na mídia exercem poder e influência, representando tanto sua organização em particular como a indústria como um todo. Elas moldam a cobertura e as redações.”

A pesquisa identificou uma grande variação de país a país na quantidade de pessoas que acessam notícias de veículos liderados por uma mulher. No Quênia, o percentual é de 81%. Na África do Sul é de 80%. Na outra ponta estão o Brasil, com 24%, e o Japão, com míseros 5%.

Nomeações de estrelas não refletem indústria

Ironicamente, algumas grandes redações globais nomearam mulheres para o comando em tempos recentes, dando a (falsa) impressão de que a situação mudara.

Foi o caso da Reuters, que entregou o bastão à italiana Alessandra Galloni. Além de ser a primeira mulher a liderar a agência de notícias britânica em 170 anos, ela não tem o inglês como língua materna.

O Washington Post escolheu Sally Buzbee como editora executiva, a primeira em 144 anos.

Na Associated Press, Daisy Veerasingham tornou-se CEO, em um triplo pioneirismo: é a primeira mulher, não branca e nascida fora dos EUA a dirigir a agência.

Em 2020, Roula Khalaf havia sucedido o lendário editor Lionel Barber no Financial Times.

Contudo, examinando um conjunto mais amplo de empresas, a realidade constatada pelo Reuters foi bem diferente: dos 51 novos editores nomeados em um ano, somente 23% eram mulheres.

Para quem estiver em busca de inspiração, os modelos a seguir são Espanha, Reino Unido e EUA.

Nos três mercados, a metade ou mais dos novos chefes de redação nos últimos 12 meses foram jornalistas do sexo feminino, uma prova de que é possível aumentar o equilíbrio e equalizar as oportunidades.


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