Carlos Maranhão, ex-diretor de Redação das Vejinhas, e o filho, Tiago Maranhão

Filho e neto (pelo lado materno) de jornalistas, Tiago tinha uma vocação hereditária. Mas iria seguir o mesmo caminho? Sem nunca ter procurado influenciá-lo diretamente, fiquei em dúvida até o dia em que ele marcou um almoço comigo e sua mãe para falar sobre o próprio futuro. Foi direto ao ponto e disse que iria prestar vestibular para Jornalismo. Perguntei se estava ciente das dificuldades do mercado e de que os salários dos seus pais – eu como diretor de Redação, ela como editora de arte – eram exceções e não a regra na profissão. Ele respondeu que sim para as duas perguntas e erguemos um brinde para lhe desejar boa sorte.

Embora seja complicado elogiar publicamente um filho, passados mais de 20 anos não posso esconder meu orgulho: Tiago tornou-se um jornalista respeitado e bem-sucedido. Não só, inicialmente, no meio impresso e em sites, mas sobretudo na televisão e hoje em dia no meio que desconheço por completo, a inteligência artificial.

Graças ao convite honroso de J&Cia., tive agora a chance de passar tudo isso em revista (sem trocadilho) e de lhe perguntar coisas sobre as quais nunca havíamos conversado com alguma profundidade. Eis aí.

Pai: Por que você resolveu ser jornalista?

Filho: Acho que nunca sequer considerei outra carreira. Para ser completamente honesto, contemplei a ideia de estudar Direito durante um período. Mas senti que o jornalismo era a minha vocação. Nunca encarei em termos de carreira, mas sim com um sentido de missão e realização.

Pai: Que missão?

Filho: Informar com clareza, traduzindo o que é nebuloso, checando o que é suspeito, dando o espaço correto ao que é mais relevante. Dar contexto é fundamental, manter uma perspectiva saudável é essencial. Se puder fazer isso com alguma graça e personalidade, missão cumprida.

Pai: Quando você tomou a decisão de ser jornalista?

Filho: Durante os últimos anos no colégio, já pensando no vestibular, eu alimentava uma visão romântica da profissão, me imaginava em grandes coberturas, com textos de fôlego, sonhava em ser repórter especial de uma grande revista. Acredito que nessa época eu já estava decidido. O curioso é que o jornalismo esportivo não era necessariamente meu plano principal, nem o trabalho em televisão. Foram caminhos que minha carreira tomou, um pouco por decisão minha e oportunidades que persegui, muito por sorte também.

Pai: O que é jornalismo para você?

Filho: Jornalismo é contar histórias que precisam ser contadas. A partir daí, a definição começa a ficar flexível. Talvez essas histórias precisem ser contadas porque estão escondidas e são de interesse público, ou porque são injustiças que precisam ser corrigidas ou talvez apenas porque são histórias divertidas, quem sabe inspiradoras ou simplesmente boas histórias.

Pai: Eu praticamente só trabalhei em revistas – Placar, Playboy, Veja, Veja São Paulo – e vivi quatro décadas na Editora Abril. Você, ao contrário, esteve em quase todas as mídias, passando por Reuters, iG, Exame, Band, Globo e SporTV, antes de ir para a Amazon, onde atualmente cuida do conteúdo da Alexa. Quem de nós tomou as melhores decisões na carreira?

Filho: Queria evitar respostas exageradamente clichês, mas aqui preciso dizer que sua carreira sempre foi minha maior referência profissional. E não porque foi uma carreira de sucesso, com coberturas que um dia eu sonhava fazer, como Copas do Mundo e Jogos Olímpicos, e por dirigir grandes redações, e sim pelo respeito e deferência que sempre falam de você para mim: “O Maranhão tem o melhor texto”, “seu pai faz as melhores entrevistas”, “ninguém apura com tanto rigor”, entre outros elogios que ouço.

Pai: Obrigado, mas fico até constrangido…

Filho: Bem, dito isso, acho que o mercado mudou demais e muito rápido nas últimas décadas, o que talvez explique minha experiência mais, digamos, diversa. O que posso afirmar é que tudo me serviu de aprendizado para o que veio em seguida.

Pai: Quais são para você as principais diferenças entre o que eu fazia e o que você faz no jornalismo?

Filho: Talvez a principal diferença seja o formato. Ou melhor, formatos. Décadas atrás, uma matéria de revista era pensada apenas para as páginas impressas da revista. Depois vieram os formatos para site, celular e tablet. Hoje os formatos são interativos, uma reportagem pode ser um carrossel no Instagram, uma entrevista pode estar no TikTok com uma edição esperta ou no YouTube com links para outros conteúdos. Há também uma diferença na percepção de quem recebe a notícia em relação ao veículo e ao jornalista. Existe um conceito que se forma antes mesmo de se ler a manchete.

Pai: A mais velha das suas três filhas optou por uma área completamente diferente da nossa: a neurociência. As duas menores têm hoje 7 e 2 anos de idade. Gostaria que pelo menos uma delas se tornasse jornalista?

Filho: A Isabel já está a poucos meses de concluir o doutorado em neurociência e acredito que vai seguir nessa carreira. Já Cecília e Clara, as mais novas, se eu fosse apostar, diria que vão adotar profissões que sequer foram inventadas ainda. Algo relacionado a comunicação, quem sabe?

Pai: Onde você imagina que estará daqui a cinco anos? Dez? Vinte?

Filho: Três meses antes de ir para a Amazon, eu sequer cogitava mudar de emprego, muito menos trabalhar com inteligência artificial. Então, gosto de pensar que ainda vou me surpreender algumas vezes com os rumos da minha carreira. A única coisa que sei é que vou sempre trabalhar com as palavras. Como você.

0 0 votes
Article Rating
Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments