Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

A invasão dos prédios dos Três Poderes em Brasília entrou na pauta de pesquisadores e analistas políticos, que procuram explicar as motivações e os mecanismos de mobilização para os atos que novamente retrataram o Brasil de forma negativa na mídia global.

Um dos que se debruçou sobre o tema foi o think thank Institute for Strategic Dialogue, baseado em Londres e com forte atuação nos EUA. O centro acompanha movimentos de desinformação e o avanço de teorias conspiratórias, que cresceram significativamente depois da era Trump.

Em um estudo analisando os acontecimentos do Brasil, os autores Jiore Craig, Cécile Simmons e Rhea Bhatnagar afirmaram que “imagens de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro ocupando o palácio presidencial no Brasil são uma ilustração gritante de como a desinformação eleitoral espalhou-se além dos EUA e ameaça a integridade eleitoral em todo o mundo”.

Infelizmente, o Brasil não é o único lugar além dos EUA a sofrer desse mal. O ISD cita França, Alemanha e Austrália como nações em que o fenômeno repetiu-se recentemente.

Ao analisar o conteúdo de redes sociais nos três mercados, os pesquisadores dizem ter encontrado três questões recorrentes associadas a eleições.

Uma delas é que os recursos existentes nas plataformas de mídia social favorecem a desinformação eleitoral e são úteis para os que a promovem.

Eles apontam que os Shorts do YouTube e os Reels do Instagram, criados para fazer frente a concorrentes focados em vídeo como o TikTok, tornaram mais fácil burlar os sistemas de moderação das plataformas.

O segundo é a ligação do que chamam de “negação eleitoral online”, com teorias conspiratórias baseadas em ódio, supremacia branca, xenofobia e racismo.

O terceiro é que o negacionismo eleitoral sozinho não é suficiente para radicalizar eleitores insatisfeitos. Mas a eficácia aumenta quando o tema se mistura a outros tipos de discurso de ódio. E diminui em nações com autoridades eleitorais centrais fortes e medidas de responsabilização sobre as plataformas digitais.

Países com outros idiomas que não o inglês são mais vulneráveis, porque a moderação das redes sociais é deficiente. Esse problema não é novo. Vem sendo apontado há anos.

Em 2021, uma coalizão de entidades de defesa dos direitos humanos, justiça racial e responsabilidade na internet, liderada pelo grupo Real Facebook Oversight Board, lançou a campanha #Ya Basta Facebook!, exigindo da rede social ação mais enérgica no controle da desinformação e discurso de ódio na plataforma em língua espanhola.

O problema não parece ter melhorado, na avaliação dos pesquisadores do ISD, que destacam a concentração de recursos na proteção de usuários das redes que falam inglês. Isso inclui brasileiros, franceses, alemães e a parcela expressiva de norte-americanos que têm o espanhol como idioma principal.

Mas até em inglês a desinformação eleitoral sobre o Brasil encontrou terreno fértil para florescer, ajudada por Elon Musk.

Crédito: Reprodução/uk.usembassy.gov

O estudo menciona uma postagem do dono do Twitter sugerindo que a rede social foi tendenciosa durante as eleições presidenciais, favorecendo a esquerda. O post foi citado em uma reportagem do jornal sensacionalista New York Post, que viralizou sob as hashtags #brazilianspring e #brazilwasstolen.

A batalha é complexa, porque não envolve apenas as redes, mas também veículos de mídia tradicionais, como o caso do jornal americano e a Fox News.

A emissora, que sempre apoiou o ex-presidente Donald Trump e deu espaço às suas ideias, é objeto de um processo movido pela Dominion Voting Systems, empresa que forneceu as máquinas de votação no pleito de 2020.

Ela foi acusada de fraude, como parte de uma conspiração para roubar a eleição presidencial de 2020 deTrump.

A ação é de difamação, com um pedido de indenização de US$ 1,6 bilhão. Por coincidência, New York Post e Fox pertencem ao mesmo dono, o magnata da mídia Rupert Murdoch.

A Dominion pode ganhar a causa, ser ressarcida dos danos que sofreu e resgatar sua imagem. Mas o dano sofrido pela sociedade com a desinformação eleitoral não tem preço, e ninguém paga por ele.


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