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quinta-feira, março 28, 2024

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Memórias da Redação – O publisher

Abrimos o ano com uma colaboração de Francisco Ornellas, que criou e por 22 anos esteve à frente do Curso de Focas do Estadão, hoje diretor Editorial do Diário de Mogi (SP).

O publisher

Restam poucos deles em atividade. A figura do publisher parece ter ficado nos livros que contam a história do jornalismo. Aquela figura que encarna os princípios de uma publicação e segue cuidando de preservá-los. Havia o publisher político, mais preocupado em administrar interações de bastidores e o publisher estadista, para o qual o veículo é o elo da comunidade, pronto a lhe servir. Foram substituídos pelo financial manager: para este, o que importa são os números do balanço financeiro.

Antológica a passagem de Júlio de Mesquita Filho, publisher do Estadão entre 1927 e 1969. Um dos ideólogos do golpe de 1964, com a ascensão dos militares e o início da caça às bruxas, saiu em defesa de seus jornalistas de vocação à esquerda: “Com meus comunistas ninguém mexe, deles cuido eu”.

Sem figura de destaque a exercer esse papel na grande imprensa, restam eles nos veículos regionais. Destes, um dos mais longevos é Tirreno Da San Biagio. Paulista, filho de italiano, dirige há 56 anos o Diário de Mogi, jornal que ele fundou. Tem 82 anos e é sempre o primeiro a chegar à redação. Nunca depois das 6 da manhã. Isto lhe permite algumas ações inusitadas para quem, além do jornal, controla a TV Diário, afiliada da Rede Globo em Mogi das Cruzes: há um mês a notícia de um grave acidente, com mortes, chegou a essa hora; não havia plantonista e lá foi o publisher fazer a foto para a capa da edição seguinte.

Há muitas, incontáveis histórias nessa trajetória. Como a de 2 de abril de 1964: o País vivia a ressaca do golpe quando um sisudo professor engravatado chegou ao jornal sem avisar. Ao seco bom dia, estendeu um envelope a Tote, como é conhecido o jornalista. Ele abriu a correspondência, leu e de pronto a rasgou. Escorraçou com o engravatado em seguida. No envelope, um ofício do comandante do Tiro de Guerra local, que credenciava o professor como censor do Diário de Mogi. Nunca mais voltou.

Outra: era 1966, Manoel Bezerra de Melo, o Padre Melo, havia quatro anos se instalara em Mogi das Cruzes e, nesse ano, realizara o primeiro vestibular no que viria a ser a Universidade de Mogi das Cruzes, ainda hoje de sua propriedade. Foi para a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. No ano seguinte se elegeria deputado federal. Também seria prefeito da cidade (1994-1996). Telefonou agendando visita. Chegou pouco antes do almoço, de batina e, recebido por Tote Da San Biagio, foi direto ao assunto: vim aqui comprar o Diário de Mogi. Respeitoso, Tote disse-lhe que o jornal não estava à venda, que o jornal lhe era como um filho, ao qual se dá a vida sem ser dono de sua vida.

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