Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

Instituições culturais não costumavam figurar entre as organizações mais visadas por ativistas, mas na Europa e nos EUA elas se tornaram alvo de barulhentas campanhas questionando patrocínios e até o acervo, sua razão de ser.

Um dos casos mais notórios é a longa batalha diplomática, política e de comunicação para devolver à Grécia as esculturas de mármore do Parthenon, estrelas do British Museum.

O movimento cresceu após a morte de George Floyd, que desencadeou debates sobre escravidão, colonialismo e imperialismo.

Ao mesmo tempo, a preocupação com a mudança climática tornou vulneráveis centros culturais apoiados pelo setor de combustíveis fósseis, caso do Science Museum de Londres.

Há um ano, cientistas, ativistas, universitários e alunos de escolas acamparam no saguão do prédio como um tributo às “vítimas” dessas empresas, protesto organizado pelo grupo Fossil Free Science Museum.

O ato foi motivado pelo anúncio da galeria Energy Revolution: The Adani Green Energy Gallery, espaço voltado para crianças e jovens que apresenta tecnologias para reduzir o uso de combustíveis fósseis, a ser aberto em 2023.

O problema é que o Adani opera no setor de carvão. Embora tenha perdido membros do Conselho por causa do projeto, o Museu não voltou atrás.

Em novo protesto, em julho, foi entregue à direção uma petição assinada por mais de 400 professores ameaçando não mais levar seus alunos caso a galeria seja instalada. Os signatários alegam que “para virar a maré do aquecimento catastrófico é preciso deixar os combustíveis fosseis no solo, e os interesses dos patrocinadores vão contra isso”.

Em entrevista, o CEO do Science argumentou que a abordagem certa é engajar e desafiar as empresas a fazerem mais pelo clima, e não cortar laços.

V&A cede a pressões do Sackler Pain

Já o Victoria & Albert Museum resolveu não brigar e seguiu os passos do British Museum e da National Gallery. No último fim de semana, placas com nome da família Sackler foram removidas de um pátio interno e do centro de educação artística de sua sede, em Londres.

A fortuna dos Sackler, grandes patronos da arte, veio do negócio de medicamentos opioides. A família virou alvo da campanha Sackler Pain, comandada pela fotógrafa americana Nan Goldin, ex-dependente.

Nan Golin lidera protesto contra a família Sackler

Nem o fato de a Purdue Pharma, fabricante do analgésico OxyContin, ter falido, foi suficiente para acalmar os ativistas.

Theresa Sacker, que tem o título de “Dame” por sua contribuição à arte, fazia parte do Conselho até 2019, quando o movimento explodiu. No comunicado, o V&A informou que a decisão foi tomada de comum acordo com a família.

RP para levar os Elgin Marbles de volta

Renomear espaços é mais fácil do que devolver “joias da coroa”, problema do British Museum e de vários outros. Os Elgin Marbles foram removidos do Parthenon por Lord Elgin em 1801, supostamente com permissão das autoridades otomanas.

Na onda anti-imperialista pós-Floyd, a Grécia ganhou mais aliados. Um deles é o magnata grego John Lefas, que está investindo o equivalente a R$ 60 milhões em uma campanha para convencer parlamentares britânicos sobre a devolução, já que a lei teria que ser mudada para que ela aconteça − ou o museu admitir que as peças foram roubadas.

Lefas contratou uma agência de RP em Londres para organizar encontros e viagens de parlamentares à Grécia, enquanto o governo do país escala as pressões diplomáticas e na mídia.

Em entrevista ao The Times no domingo, o primeiro-ministro grego Kyriakos Mitsotakis mandou um recado duplo. Ele anunciou que vai pedir a devolução à nova primeira-ministra Liz Truss, o que seria a seu ver “um gesto fantástico” no momento em que o país “está meio que encurralado em termos de imagem”. E disse achar que o rei Charles é favorável, embora entenda sua neutralidade na questão.

Elgin Marbles

Outras estrelas de museus, como a Pedra de Rosetta do British Museum e os Bronzes de Benin espalhados pelo mundo − alguns já devolvidos − também são alvo de movimentos de repatriação.

Independentemente de quem está com razão, as instituições culturais têm uma crise difícil para administrar: atender aos anseios de parte da sociedade ou manter acervos e recursos para cumprir sua missão e ficar sob ataque.


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