O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), está tentando censurar veículos jornalísticos após reportagens sobre acusações de corrupção envolvendo o deputado, e de violência contra sua ex-mulher Jullyene Lins. As ações foram abertas em junho na Justiça de Brasília, e aguardam julgamento.

Por meio de ações judiciais, Lira tenta silenciar o trabalho de ao menos dois veículos de imprensa. Não se sabe se o deputado entrará com novas ações contra outras empresas jornalísticas.

O mais recente caso de assédio judicial ocorreu com a Agência Pública, que publicou uma entrevista com a ex-mulher de Lira, que o acusou de violência sexual, física e psicológica. O deputado entrou com ação na 14ª Vara Cível de Brasília contra a Pública e a ex-esposa, sob a alegação de danos morais. Ele pediu R$ 100 mil de indenização e a retirada do conteúdo do ar.

O pedido de tutela de urgência apresentado por Lira na ação foi indeferido pelo juiz Luiz Carlos de Miranda. O magistrado entendeu que a reportagem é de interesse público e visa a informar os leitores. Lira também havia solicitado que o processo corresse em segredo de justiça, o que também foi indeferido pelo juiz da ação.

“Não é demais lembrar que o autor, por ser figura pública e política de inegável importância no cenário brasileiro, desperta legítimo interesse quanto aos seus atos de governo, mas também quanto à sua vida pessoal”, declarou o magistrado.

Em nota da direção, a Agência Pública escreveu que repudia “a tentativa de intimidação judicial com pedido de censura prévia”. O veículo reiterou que a reportagem em questão “foi feita com base em documentos judiciais e fontes que deram seu depoimento sobre os fatos. Os pedidos de entrevista com as pessoas retratadas foram realizados com total lisura, ética jornalística e respeito à privacidade, com contatos por telefone e pessoalmente”.

A Pública declarou que entrou em contato com Lira para esclarecimentos e abriu espaço para ouvir e publicar o lado do deputado, que optou por não responder aos questionamentos.

ICL Notícias também sofre tentativa de censura prévia

Nesta semana, Arthur Lira também entrou com ação judicial contra o ICL Notícias, para remover reportagens, entrevistas e comentários produzidos pelo veículo. Na ação, o deputado destaca um programa específico em que o ICL abordou acusações contra ele.

No programa em questão, o ICL Notícias falou sobre o arquivamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de uma investigação contra o deputado por corrupção passiva, envolvendo o suposto recebimento de R$ 106.000 em propina por meio de um assessor, e denúncias de envolvimento de um auxiliar de Lira na aquisição superfaturada de kits de robótica para escolas de Alagoas, além das denúncias de violência contra sua ex-mulher.

Lira entrou com uma ação na 24ª Vara Cível de Brasília para a retirada de ao menos 43 vídeos do ICL Notícias, além de indenização de R$ 300 mil por dano moral. O deputado pediu em caráter de urgência que todos os links do programa, incluindo trechos publicados pelos participantes, fossem retirados das redes sociais. Mas o juiz Gustavo Fernandes Sales negou a tutela de urgência, afirmando que a retirada do conteúdo do ar sem que passasse pelo trâmite normal do processo de danos morais poderia “impor verdadeira censura à liberdade de imprensa”.

Para Eduardo Moreira, responsável pela Editora Conhecimento Liberta, que produz o ICL Notícias, “não há dúvidas, trata-se de covarde e vergonhosa censura. É inaceitável o chefe de um dos três poderes de uma República dita democrática tentar calar um canal de informações via pressão política e jurídica”.

Seguidores do ICL Notícias estão promovendo um abaixo-assinado em defesa da liberdade de imprensa e em repúdio à ação de Lira. No momento da publicação deste texto, o manifesto contava com mais de 133 mil assinaturas. A hashtag #TocomICL também viralizou nas redes sociais.

Entidades repudiam atitude de Arthur Lira

Organizações defensoras da liberdade de imprensa publicaram nota conjunta em repúdio às ações judiciais de Arthur Lira contra os veículos jornalísticos. Para as entidades, trata-se de uma “tentativa de silenciar meios de comunicação” e “tentativa de censura e cerceamento da liberdade de imprensa”.

“É inadmissível que o presidente da Câmara dos Deputados, um dos poderes que devem zelar pelos preceitos constitucionais, faça uso do Judiciário para cercear conteúdos jornalísticos que lhe desagradam”, diz a nota. “A negativa de retirada imediata das reportagens, proferida por dois magistrados diferentes, é um dos sinais do equívoco e do exagero do parlamentar em lidar com o noticiário e com os profissionais de imprensa em uma situação que, certamente, lhe causou desconforto”.

Assinam a nota Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Instituto Vladimir Herzog, Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, Instituto Palavra Aberta e Instituto Tornavoz.

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