Por Álvaro Bufarah (*)

Numa era dominada por telas, swipes e algoritmos de recomendação, o rádio continua sendo um daqueles sobreviventes improváveis − não porque ficou no passado, mas porque aprendeu a atravessar o tempo. E a nova pesquisa divulgada pelo Katz Radio Group, com base em dados da Nielsen Scarborough USA+ 2023, mostra com precisão matemática o que muitos já percebiam na prática: o rádio segue firme como trilha sonora da vida moderna, não importa o quanto você assista à TV ou navegue na internet.

O levantamento traz um recorte valioso: o público entre 25 e 54 anos, faixa etária que reúne Geração X, Millennials e a ponta mais velha da Geração Z − ou seja, quem está no auge da produtividade e do consumo. Neste grupo, o rádio alcança impressionantes 91% da audiência toda semana, com a média diária de 1 hora e 12 minutos de escuta ativa. E aqui entra o dado mais intrigante: isso vale tanto para os usuários mais intensivos de outras mídias quanto para os mais moderados. Ou seja, mesmo quem passa horas no TikTok ou na Netflix não deixa de ouvir rádio.

O estudo mostra que 93% dos “superusuários” de TV e 90% dos “heavy users” de internet continuam ouvindo rádio em níveis semelhantes à média nacional dos EUA. Mas o destaque talvez esteja na outra ponta do gráfico: usuários “leves” − aqueles que quase não veem TV ou navegam pouco online − têm no rádio seu principal ponto de contato com o mundo. O rádio alcança 91% dos consumidores leves de internet e 89% daqueles que assistem pouca televisão, revelando sua importância para públicos menos impactados por campanhas digitais ou por excesso de informação visual.

Esses dados reforçam uma verdade antiga com roupagem atual: o rádio é a mídia da ubiquidade. Ele está presente no carro, na cozinha, no trabalho, na fila do banco, no campo, no smartphone, no alto-falante do motorista de aplicativo. Não exige conexão banda larga nem atenção exclusiva. O rádio cabe nos intervalos da vida − enquanto a gente dirige, lava louça, arruma a casa ou apenas quer companhia sem distração.

O cenário norte-americano ajuda a compreender o fenômeno global, mas tem eco direto no Brasil. Segundo o Kantar Ibope Media, o rádio brasileiro alcança 84% da população nas 13 maiores regiões metropolitanas do País, com média diária de escuta acima de 4 horas − uma das maiores do mundo. Em 2023, o Brasil já contabilizava mais de 4.800 rádios comerciais e comunitárias ativas, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), e a presença digital só cresce.

O Painel Nacional de Audiência de Rádio de 2024 mostrou que mais de 70% dos ouvintes brasileiros escutam rádio também pela internet, seja via aplicativos, streaming ou smart speakers. Essa transição da frequência para a nuvem só reforça o que a pesquisa americana já indica: o rádio não compete com o digital − faz parte dele.

Os anunciantes começam a redescobrir esse poder. O rádio é um meio de alta penetração, segmentação geográfica precisa e impacto emocional imediato. Segundo o Audio Advertising Report da IAB (2024), campanhas em rádio geram aumento médio de 18% em lembrança de marca e podem ser até 50% mais eficientes em termos de custo por mil impressões, em comparação com mídias digitais de display.

O rádio não precisa de tela para ser visto, nem de efeito sonoro para ser notado. Ele apenas precisa ser ouvido. E os dados do Katz e da Nielsen são um lembrete técnico e contundente de que a escuta é um comportamento resiliente e profundamente humano. Num mundo onde o excesso de informação gera confusão, o rádio oferece clareza. Onde há ruído, ele entrega contexto. Onde falta tempo, ele ocupa com leveza.

Ele (rádio) pode não ser o meio mais moderno, mas é, paradoxalmente, o mais adaptável. E, por isso mesmo, talvez seja o mais difícil de substituir.

Fontes utilizadas:

  • Katz Radio Group. Scarborough USA+ 2023 R2 Report.
  • Nielsen Scarborough. U.S. Audio Media Consumption Trends, 2023.
  • Kantar Ibope Media. Inside Radio Brasil 2024. https://www.kantaribopemedia.com
  • Anatel. Painel de Rádios no Brasil, 2024. https://www.gov.br/anatel
  • IAB. Audio Advertising Effectiveness Report, 2024. https://www.iab.com
  • Journal of Advertising Research. Audio in the Cross-Platform Ecosystem, 2023.
  • Entrevistas com executivos da P&G e análises publicadas em Inside Radio e Radio Ink.

Álvaro Bufarah

Você pode ler e ouvir este e outros conteúdos na íntegra no r, um blog que teve início como uma coluna semanal na newsletter Jornalistas&Cia para tratar sobre temas da rádio e mídia sonora. As entrevistas também podem ser ouvidas em formato de podcast neste link.

(*) Jornalista e professor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e do Mackenzie, pesquisador do tema, integra um grupo criado pela Intercom com outros cem professores de várias universidades e regiões do País. Ao longo da carreira, dedicou quase duas décadas ao rádio, em emissoras como CBN, EBC e Globo.

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