Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

Mais associado a temas leves e ao mundo feliz das celebridades promovendo viagens e produtos de luxo, o Instagram não costuma ser visto como uma plataforma de mídia social apropriada para assuntos hard news.

No entanto, um estudo feito pela USC (University of Southern California) demonstrou que a rede social teve um papel vital em uma das maiores mobilizações sociais recentes, o movimento Black Lives Matter, graças ao poder das imagens que são a sua base.

Além de consagrar o Instagram como rede que pode ser mais do que a favorita de marcas e influenciadores profissionais, o estudo coloca também em pauta o papel do jornalismo tradicional e do Twitter, visto como a plataforma número um para questões sociais.

O poder mobilizador de vídeos e fotos no Instagram no caso George Floyd dá vida nova à antiga frase “uma imagem vale mais do que mil palavras”.

O estudo da USC, publicado no periódico científico PLOS One em dezembro passado, analisou mais de 1,1 milhão de postagens e 1,6 milhão de fotos no Instagram publicadas em um período de 30 dias após o assassinato de Floyd com a hashtag #JusticeForGeorgeFloyd.

Os pesquisadores concluíram que fotos e vídeos foram os principais responsáveis por amplificar as conversas online sobre direitos civis, impulsionando atos como as marchas do movimento Black Lives Matter e o debate público sobre racismo.

Jornalistas independentes, ativistas, artistas e grupos de memes estavam entre os muitos formadores de opinião que emergiram durante os protestos graças a conteúdos visuais que se tornaram virais, diz o estudo.

Segundo os pesquisadores, isso contrasta com plataformas baseadas em texto como o Twitter, nas quais vozes com poder institucional (como políticos, mídia tradicional ou departamentos de polícia) controlam o fluxo de informações.

Houve também uma mudança de enfoque. Para os autores, a nova onda de líderes de opinião que floresceu no Instagram após o assassinato de Floyd ajudou a reformular as narrativas ao postar imagens que retratavam os protestos como memoriais em vez de tumultos, como são tradicionalmente enquadrados pela mídia tradicional.

E representavam os manifestantes como pessoas que sofriam, e não como arruaceiros.

Para quem tem saudades dos velhos tempos do Twitter, o estudo acentua o poder das imagens para engajar a sociedade em causas, o que a rede hoje controlada por Elon Musk fez em seus primeiros anos de vida, quando era menos dominada por fontes institucionais.

E tomando como exemplo a morte de George Floyd, o estudo da USC levanta ressalvas sobre o impacto da cobertura de protestos pela mídia tradicional, visto que criadores de conteúdo, jornalistas independentes e usuários comuns foram os reais responsáveis por levar as pessoas às ruas.

Cena da morte de George Floyd

É interessante recordar as imagens que desencadearam o BLM, provocando uma tomada de consciência sobre racismo estrutural, colonialismo e escravidão em todo o mundo, não foram feitas por um cinegrafista profissional.

O assassinato poderia ter sido mais um entre tantos episódios de violência policial contra negros nos EUA se Darnella Frazier, de 17 anos, não tivesse usado seu celular para documentar o policial branco com o joelho sobre o pescoço de Floyd, postando o vídeo chocante no Facebook.

Exemplo do jornalismo-cidadão, Frazier foi homenageada pelo mais importante prêmio de imprensa do mundo, o Pulitzer.

Darnella Frazier e seu prêmio

Em 2021, ela recebeu uma homenagem especial na série anual de premiações da entidade, justificada como reconhecimento do papel dos cidadãos na busca do jornalismo por justiça e verdade.

Embora as grandes empresas de mídia social recriminadas pela proliferação de discurso de ódio e fake news em suas plataformas, estudos como esses confirmam o valor da tecnologia que deu voz a pessoas comuns e onde há censura sobre meios de comunicação tradicionais.

Ou em situações em que o jornalismo tradicional não percebe tão rapidamente para onde os ventos da mudança estão soprando.


Para receber as notícias de MediaTalks em sua caixa postal ou se deixou de receber nossos comunicados, envie-nos um e-mail para incluir ou reativar seu endereço.

0 0 votes
Article Rating
Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments