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sábado, junho 21, 2025

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O adeus a Rodolfo Konder

Faleceu no último dia 1º/5, em São Paulo, aos 76 anos, vítima de insuficiência cardíaca e renal, Rodolfo Konder, o primeiro a denunciar a morte, sob tortura, de Vladimir Herzog nas dependências do DOI-Codi, em outubro de 1975, onde também estava preso. Diretor da representação da ABI em São Paulo, natural de Natal, Konder estava internado havia quase três meses no Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo para tratamento de câncer no pulmão. Deixa viúva e filho. Seu corpo foi cremado no Crematório Horto da Paz, em Itapecerica da Serra. Escritor, jornalista, professor e tradutor, teve passagens, entre outras, pelas redações de Realidade, Visão, IstoÉ, Afinal e Nova, foi editor-chefe e apresentador do Jornal da Cultura, na TV Cultura de São Paulo, e colaborador do Estadão por dez anos. Foi ainda secretário Municipal de Cultura de São Paulo, membro do Conselho da Fundação Padre Anchieta, integrou a diretoria da Bienal de São Paulo e foi presidente e vice-presidente da Seção Brasileira da Anistia Internacional. Na área acadêmica, foi professor de Jornalismo na Faap e diretor da Fiam. Ganhador do Prêmio Jabuti de 2001 com Hóspede da solidão, tinha 33 livros publicados. Em nota, o Instituto Vladimir Herzog assim se manifestou sobre o falecimento: “Ao arrostar os agentes da repressão, denunciando a tortura e assassinato de Vladimir Herzog no DOI-Codi de São Paulo, Rodolfo tornou-se o pilar inicial e indispensável da ação declaratória impetrada pela família Herzog, que culminou em 1978 na condenação do Estado brasileiro pelo crime, por sentença judicial. (…) Ao lamentar profundamente o seu falecimento, após persistente enfermidade, o Instituto Vladimir Herzog expressa a certeza de que o nome de Rodolfo Konder, valoroso e solidário em tempos penosos, será para sempre lembrado com honra e carinho, não só por todos os que tivemos o privilégio de conhecê-lo pessoalmente, mas também nas páginas da História da democracia brasileira”. Vitor Sznejder (ex-O Globo), que o entrevistou para seu livro Jornalistas, diz que “história de sua vida renderia um roteiro cinematográfico, cheio de aventuras, exílios e contradições: imperdoavelmente, para muitos dos seus ex-companheiros do Partido Comunista, Konder foi secretário de Cultura de São Paulo nos governos Maluf e Pitta, de quem fala nessa entrevista, concedida em 7 de março de 2001. Aborda, também, o processo de desintegração da personalidade do amigo e também jornalista Pimenta Neves, que, um ano antes, assassinou a tiros a namorada Sandra Gomide”. Leia a íntegra da entrevista Audálio Dantas, que presidia o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo na época da morte de Herzog e que contou em livro a história dele (As duas guerras de Vlado Herzog), escreveu no facebook uma homenagem a Konder, que reproduzimos a seguir, com a devida autorização: Testemunho de um assassinato Rodolfo Konder foi um dos onze jornalistas sequestrados pelos agentes do DOI-Codi, em outubro de 1975, antes que eles deitassem a mão em Vladimir Herzog. Eram todos acusados de atividades comunistas. No dia 25 de outubro, pela manhã, Konder, que já fora torturado, estava sentado num banco de madeira num corredor, ao lado de seu companheiro George Duque Estrada. Os dois estavam encapuzados, como os demais prisioneiros que naquele dia lotavam o DOI-Codi, o sinistro aparelho de tortura montado pelo II Exército em São Paulo. Estavam ali para uma acareação. Logo foram chamados e levados para uma cela em frente. Ordenaram-lhes que tirassem o capuz e eles puderam ver a figura de Vladimir Herzog na “cadeira do dragão”, sendo “preparado” para a sessão de choques elétricos. O torturador (Pedro Antônio Mira Grancieri, soube-se depois) queria saber nomes de outros jornalistas pertencentes à base do PCB. Vlado negava-se a apontar nomes. Konder e Duque fora levados de volta ao corredor, de onde ouviram os primeiros gritos de Vlado sendo torturado. A tortura prolongou-se por horas. Outras vezes Konder e Duque foram levados para novas acareações. Na última, Konder viu pela última vez o Vlado sentado na “cadeira do dragão”, as mãos trêmulas, a voz quase sumida. Mas, do corredor, logo depois eles ouviram gritos que, aos poucos, foram cessando. Descrevo o final em meu livro As duas guerras de Vlado Herzog: “A tarde avançava, e com ela a agonia. Num momento impreciso fez-se o silêncio que parecia impossível naquele inferno (…) A noite caiu pesadamente naquele sábado, 25 de outubro. Vlado estava morto.” Rodolfo Konder, uma das testemunhas do assassinato de Vlado, morreu na manhã da última 5ª.feira, dia 1º de maio. Tinha no corpo as marcas da tortura e na alma a angústia vivida naquele 25 de outubro.

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