Por Álvaro Bufarah (*)

Na fotografia global do consumo de notícias, o rádio permanece como um ponto de confiança em meio ao turbilhão digital. O Digital News Report 2025, divulgado pelo Instituto Reuters, mostra que, embora a audiência das mídias tradicionais continue em declínio, o rádio mantém um papel resiliente e relevante, especialmente como fonte de credibilidade em tempos de incerteza. Enquanto a TV aberta e os jornais impressos perdem terreno para plataformas digitais e redes sociais, o rádio preserva parte de seu espaço, principalmente entre ouvintes que ainda valorizam a apuração e a profundidade do jornalismo profissional.

Essa resiliência contrasta com a crescente fragmentação do consumo de notícias no ambiente digital. Segundo o relatório, o engajamento com mídias tradicionais caiu globalmente, enquanto redes sociais, agregadores e serviços de vídeo, como YouTube, TikTok e Instagram, ampliaram seu alcance como canais informativos. Cerca de 36% dos entrevistados afirmam recorrer ao Facebook para notícias, e 30% ao YouTube, enquanto o TikTok registra 16% de uso para conteúdos jornalísticos, especialmente entre os mais jovens.

O estudo destaca que as redes sociais já rivalizam, em muitos mercados, com os meios tradicionais de informação. O TikTok é o exemplo mais emblemático: cresceu quatro pontos percentuais no último ano, tornando-se a rede que mais ganha relevância para notícias, embora carregue elevados níveis de preocupação com desinformação, segundo 58% dos entrevistados em países como Nigéria e Quênia. No Brasil, essa preocupação é igualmente intensa, uma vez que WhatsApp, YouTube e TikTok estão entre as principais fontes de notícias, especialmente entre jovens de 18 a 24 anos.

Ainda de acordo com o levantamento, a confiança geral nas notícias se manteve estável em 40% pelo terceiro ano consecutivo, embora esteja quatro pontos abaixo do pico alcançado durante a pandemia. Serviços públicos de radiodifusão e marcas jornalísticas reconhecidas ainda figuram como as fontes mais confiáveis para verificação de fatos, algo que reforça a relevância do rádio como referência editorial.

Outro ponto central do relatório é o papel dos influenciadores digitais, podcasters e criadores de conteúdo. Nos Estados Unidos, 22% da audiência declaram consumir notícias e comentários do podcaster Joe Rogan, enquanto na França o jovem Hugo Travers (HugoDécrypte) alcança o mesmo percentual entre menores de 35 anos via YouTube e TikTok. Esses números sinalizam um fenômeno global: as novas vozes do jornalismo já não estão apenas nas redações, mas em canais independentes e plataformas digitais, muitas vezes com formatos híbridos que misturam opinião, reportagem e entretenimento.

Essa tendência é ainda mais perceptível no Brasil, onde a explosão de podcasts jornalísticos, como Café da Manhã (Folha/Spotify) e Durma com Essa (Nexo), conquistou públicos jovens e qualificados. Segundo a Kantar IBOPE Media, o País já ultrapassa 40 milhões de ouvintes regulares de podcasts, um dado que dialoga diretamente com a migração do público das ondas do rádio para os feeds digitais sob demanda.

O Digital News Report 2025 revela também que 65% do consumo de notícias no mundo já acontece via vídeos curtos em redes sociais, um crescimento expressivo se comparado aos 52% registrados em 2020. Plataformas como YouTube e TikTok lideram esse movimento, enquanto jornais tradicionais tentam adaptar seu conteúdo a formatos rápidos e visuais.

Esse comportamento reflete uma mudança cultural: em mercados como Filipinas, Tailândia e Índia a maioria das pessoas prefere assistir às notícias em vez de lê-las. No Brasil, a Globo, a Folha e veículos independentes como o Metrópoles e o UOL têm ampliado investimentos em redações multimídia, com foco em curtas para redes sociais e vídeos explicativos.

A pesquisa aponta que 7% dos consumidores já usam ferramentas de IA, como chatbots, para buscar notícias semanalmente − número que salta para 15% entre jovens de 18 a 24 anos. Embora exista entusiasmo com aplicações como traduções automáticas (24%) e resumos de notícias (27%), persiste um ceticismo sobre a transparência e precisão das informações geradas por IA.

No Brasil, a adoção de inteligência artificial em redações está em expansão. O jornal O Globo analisou mais de 600 mil discursos legislativos (2001-2024) com suporte de algoritmos para gerar conteúdo. Esse movimento mostra que a IA já é uma ferramenta estratégica para análise de dados e personalização, mas ainda enfrenta resistência editorial para a produção de notícias complexas.

Se o consumo migra para o digital, o rádio busca reinvenção e complementaridade. Em mercados como Reino Unido e Canadá, emissoras públicas apostam em plataformas digitais, transmissões híbridas e podcasts para manter relevância. No Brasil, rádios como a CBN e a BandNews FM já distribuem conteúdos multiplataforma, com boletins ao vivo no dial, streaming online, vídeos curtos e podcasts diários.

A força do rádio está em sua credibilidade histórica e na capacidade de adaptação: seja no carro, no smartphone ou em smart speakers, continua sendo um meio de escuta atenta, especialmente para notícias de última hora. Em um mundo de algoritmos e ruídos, o rádio mantém seu poder como uma voz clara e direta.

Fontes consultadas:

  • Reuters Institute for the Study of Journalism. Digital News Report 2025
  • Kantar IBOPE Media. Inside Radio Brasil 2024
  • Statista. Podcast Market Trends in Brazil, 2024
  • Folha de S. Paulo. Café da Manhã: dados de audiência 2024
Álvaro Bufarah

Você pode ler e ouvir este e outros conteúdos na íntegra no RadioFrequencia, um blog que teve início como uma coluna semanal na newsletter Jornalistas&Cia para tratar sobre temas da rádio e mídia sonora. As entrevistas também podem ser ouvidas em formato de podcast neste link.

(*) Jornalista e professor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e do Mackenzie, pesquisador do tema, integra um grupo criado pela Intercom com outros cem professores de várias universidades e regiões do País. Ao longo da carreira, dedicou quase duas décadas ao rádio, em emissoras como CBN, EBC e Globo.

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