Por Assis Ângelo
Pois é, nada me demove da ideia de que o craque do humor Chico Anysio se tenha inspirado na personagem do folclore alagoano Cesária.
Cesária, pra mim, era a Terta do Chico.
E Pantaleão, hein?
Pantaleão, pra mim, foi o Alexandre do folclore alagoano para o Chico.
Alexandre e Cesária eram marido e mulher, tão íntimos como carne e unha.
O livro Histórias de Alexandre, de Graciliano Ramos, é obra pra ser lida sem se cansar. Maravilhoso!

Dentre os 13 ou 14 contos que formam o referido livro há pelo menos quatro referências a um personagem de asas: papagaio.
O conto Um Papagaio Falador é simplesmente impagável.
Alexandre é um nordestinão todo pabuloso, cheio de onda. É um inventor de histórias que não tem pra ninguém. Inventa tudo e tudo que inventa é na hora. Na lata!
O conto, cujo título foi dito aí em cima, começa quando Cesária lembra ali na sala de tantas histórias o casamento com o seu Alexandre querido. Foi festa seguida de uma semana, segundo ela. Muita comida, muita coisa gostosa. Hilariante. De presente do sogro, ganhou a mulher e com ela um grande dote. E tal e tal.
Casado, Alexandre partiu em busca de mais grana. Consigo levou boiadeiros e tal. E também o pedido irrecusável da mulher.
E que pedido era esse, hein?
Cesária queria que Alexandre lhe trouxesse um papagaio.
E foi, foi e foi e foi…
Antes de voltar à casa, feliz da vida, Alexandre comprou um papagaio caríssimo. Mas era um papagaio que falava tudo e mais e mais.
Alexandre fez um buraco num saco e nele pôs o papagaio, que nele ficou uns dois ou três meses.
Quando voltou, esquecido do papagaio, a mulher viu aquele saco esquisito e perguntou: “O que tem aí?”.
Alexandre deu um tapa na testa e disse: “É o papagaio que comprei pra você, mulher”.
Ao abrir o saco, apareceu o papagaio balançando a cabeça e olhando fixamente nos olhos de Alexandre, dizendo com voz trêmula e bamboleante, algo como: “Isso é coisa que se faça?”.
Pois é, morreu o papagaio.
As histórias contadas do real ou do imaginário por Graciliano Ramos são muito bem “amarradas”: têm começo, meio e fim, desenvolvidas com palavras e frases econômicas.
Não é fácil um escritor começar publicando sua obra com um clássico.
Em 1933, Graciliano tinha 41 anos de idade. Com essa idade, ele publicou Caetés.
E por que estou dizendo isso?
No começo da sua vida, Graciliano era um menino cego. A sua cegueira se manifesta direta ou indiretamente em todos os seus textos. Em Caetés, inclusive. Obra-prima.
O segundo livro de Graciliano foi São Bernardo.
O narrador-personagem de São Bernardo foi um guia de cego.
O terceiro livro de Graciliano foi Angústia. Nesse livro o autor fala de um cego vendedor de bilhete de loteria, de um padre com um olho de vidro, uma mulher cujos olhos não viram o marido morrer pendurado numa corda, um velho Acrísio com olhos comprometidos com a visão… Sem falar no avô centenário do personagem, que se foi sem nada ver.
As Histórias de Alexandre têm um personagem incrível, que vê além dos olhos: cego preto Firmino.
Ah! sim: em Angústia há uma velha senhora chamada Vitória, que passa boa parte da vida tentando ensinar um papagaio a falar.
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