Cenas de truculência policial e autoritarismo marcaram na tarde desta terça-feira (9/12) os trabalhos na Câmara dos Deputados, em Brasília. Entre as vítimas, diversos jornalistas que cobriam o protesto do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), que, repetindo a ação ocorrida em agosto deste ano, quando parlamentares apoiadores de Jair Bolsonaro (PL-RJ) ocuparam por 48 horas a mesa diretora da Câmara pedindo a anistia do ex-presidente pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, também tomou o lugar do mandatário da casa, dessa vez em protesto à sessão que poderia resultar na cassação de seu mandato.
Após duas horas ocupando o espaço destinado a Hugo Motta (Rebuplicanos-PB), Braga foi retirado à força do local por policiais legislativos, mas antes que a ação ocorresse, os jornalistas que trabalhavam no Salão Verde foram empurrados com truculência para fora do local, em um caso em que as associações Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Nacional de Editores de Revistas (Aner) e Nacional de Jornais (ANJ) classificaram, em nota com junta, como “incompatível com a liberdade de imprensa”.
Durante a expulsão dos profissionais, alguns jornalistas chegaram a ser agredidos, entre eles os repórteres Ana Flor e Guilherme Balza, da GloboNews, e Carol Nogueira, do UOL, e a produtora Debora Cardoso, da Record TV. Além das agressões, o sinal da TV Câmara também foi cortado instantes antes de Braga ser retirado do local, limitando assim a transmissão da ação policial.
Retirada de jornalistas foi ordem de Hugo Motta
Guilherme Balza, que acompanhou de perto a confusão e foi inclusive um dos jornalistas agredidos, relatou para a GloboNews o que aconteceu. Ele conversou com Marcelo Guedes, chefe da Polícia Legislativa, que declarou que a decisão de esvaziar o plenário e expulsar os jornalistas do local partiu do próprio Hugo Motta.
Guedes explicou que a ideia era que, após ser retirado, Glauber Braga daria uma entrevista coletiva na parte externa, mas que os jornalistas estariam atrapalhando a saída do parlamentar. O chefe da Polícia Legislativa decidiu, portanto, retirar os profissionais de imprensa à força, sob orientação do próprio presidente da Câmara dos Deputados. Em seu perfil no X (ex-Twitter), Motta escreveu que determinou a “apuração de possíveis excessos em relação à cobertura da imprensa”.
Entidades repudiam ocorrido, pedem providências e convocam para ato na Câmara
Entidades defensoras da liberdade de imprensa repudiaram as agressões a jornalistas e pediram providências das autoridades. Como citado anteriormente, em nota conjunta, Abert, Aner e ANJ declararam que “o impedimento do trabalho de jornalistas e o corte de sinal da TV Câmara são incompatíveis com o exercício da liberdade de imprensa. Cobramos a apuração de responsabilidades para que tais práticas de intimidação não se repitam e que sejam preservados os princípios da Constituição Brasileira, que veda explicitamente a censura”.
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) descreveu o ocorrido como um episódio de “brutalidade”: “A TV Câmara teve seu sinal cortado às 17h34, mesmo horário em que os jornalistas começaram a ser retirados do plenário. As imagens da brutalidade, no entanto, foram registradas por outros parlamentares e outras pessoas que permaneceram no plenário e logo ganharam os principais portais noticiosos”.
Para a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Câmara dos Deputados viveu “cenas nunca vistas, nem nos piores tempos da ditadura militar. A ABI exige explicações do presidente da Câmara, Hugo Motta, e a sua responsabilização direta pelas agressões aos jornalistas, parlamentares e servidores, pelo desligamento do sinal da TV Câmara e pelo cerceamento do trabalho destes profissionais”.
A ABI, inclusive, anunciou nesta quarta-feira (10/12) que tomará três iniciativas jurídicas e institucionais contra Hugo Mota: Uma representação na Procuradoria Geral da República, por crime de responsabilidade pelo fato ocorrido no interior da Câmara de Deputados, com afetação ao direito à liberdade de imprensa e expressão; um informe-denúncia Internacional à Relatoria Especial de Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA; e uma representação na Comissão de Ética da Câmara de Deputados contra o Presidente Hugo Motta, por quebra de decoro parlamentar e infração disciplinar.
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) descreveram como “extremamente grave o cerceamento ao trabalho da imprensa e à liberdade e ao direito de informação da população brasileira. Não podemos admitir que medidas autoritárias, que remontam às vividas em um período não tão distante durante a ditadura militar, sejam naturalizadas e se repitam em nosso Congresso Nacional – que deveria ser a Casa do povo e não de quem ataca os direitos da população. Seguimos atentos e acompanhando os desdobramentos desse lamentável e absurdo episódio”.
A Fenaj e o SJPDF convocaram a categoria para o ato Basta de Censura! Em defesa dos jornalistas e pela PEC do Diploma, nesta quarta-feira (10/12), a partir das 14h, na Câmara dos Deputados, em Brasília. Segundo as entidades, o ato, que marca a abertura do 40° Congresso Nacional de Jornalistas da Fenaj, “ganha ainda maior relevância após os episódios de violência, sem precedentes, contra jornalistas ocorrido no Parlamento”.
Repercussão internacional
A confusão na Câmara dos Deputados estampou as páginas de diversos veículos internacionais, que destacaram não só as agressões e o caos instaurado, mas também o protesto de Glauber Braga e a aprovação do PL da Dosimetria, que pode reduzir as penas dos condenados pelos atos golpistas, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro.
O episódio foi repercutido nos jornais El País, do Uruguai; Swiss Info, da Suíça; Bloomberg, dos Estados Unidos; TN, da Argentina; e Le Parisien, da França.
























