Por Álvaro Bufarah (*)
O podcast vai se firmando como a trilha sonora do cotidiano de milhões de pessoas em todo o planeta. Longe de ser moda passageira, o formato já se tornou parte vital da dieta midiática global – e o Brasil, com seu DNA radiofônico e oralidade vibrante, posiciona-se acima da média mundial no consumo semanal de podcasts, segundo os dados mais recentes da YouGov (2025).
De acordo com a pesquisa YouGov Global Profiles, que cobre 49 mercados em todos os continentes, 41% dos consumidores globais escutam pelo menos uma hora de podcast por semana. E o Brasil não apenas acompanha esse ritmo, como ultrapassa a média: por aqui, 44% dos brasileiros declaram consumir o formato com frequência semanal, o que coloca o País entre os líderes da América Latina – atrás apenas do México (50%) e à frente da Colômbia (41%).
Berço da oralidade rica do rádio popular, das novelas radiofônicas e das rodas de conversa, o Brasil adaptou-se como poucos à lógica do podcasting. O formato, ao permitir escuta sob demanda, portabilidade e diversidade de vozes, encontrou solo fértil na pluralidade cultural e nas desigualdades de acesso que o País enfrenta. Afinal, como mostram dados do IBGE e do CETIC.br, o smartphone é o principal meio de acesso à internet no Brasil, sendo também o principal dispositivo de escuta de podcasts.
A expansão do formato, no entanto, não é exclusividade das terras tropicais. A pesquisa mostra que os maiores índices de engajamento estão em regiões aparentemente menos óbvias: o Oriente Médio e o norte da África são líderes globais na escuta regular. África do Sul, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos despontam com taxas que superam os 50%. Na Ásia, Tailândia, Indonésia e Índia reforçam a força do podcasting como um fenômeno de massas, com destaque para conteúdos educativos e espiritualistas, que se popularizam em apps locais.
Na Europa, o panorama é multifacetado. Enquanto os países escandinavos e do Leste Europeu já incorporaram o podcast como meio cotidiano, outras nações tradicionalmente ligadas à mídia impressa, como França e Alemanha, ainda demonstram um crescimento mais tímido. O Japão, por sua vez, registra níveis moderados, apesar de ser um dos maiores mercados de tecnologia e entretenimento do mundo – reflexo de uma preferência cultural por mídias visuais e conteúdos estruturados de forma diferente do modelo ocidental de podcast.
Os Estados Unidos, como era de se esperar, mantêm uma posição sólida. São o berço do podcast moderno – com plataformas como Apple Podcasts, Spotify e Amazon liderando a distribuição. Porém, a surpresa vem do Canadá, cujo engajamento é bem mais comedido, revelando que nem sempre o idioma ou a proximidade geográfica garantem aderência midiática semelhante.
No Brasil, os dados do Spotify e da Globo mostram que o público ouvinte cresce de forma exponencial, impulsionado por formatos variados: de investigações jornalísticas, como o Projeto Humanos, a humorísticos, como Podpah e Flow, passando por podcasts religiosos, de true crime e de educação financeira. Segundo a Kantar IBOPE Media, em 2024, mais de 40 milhões de brasileiros consumiam podcasts com regularidade.
Essa diversidade de vozes e narrativas dialoga com um mundo cada vez mais fragmentado e veloz. A escuta sob demanda oferece refúgio, companhia e, por vezes, sentido. Como destacou a jornalista americana Sarah Larson em artigo para a New Yorker, “os podcasts nos fazem companhia como um velho amigo invisível”. Esse companheiro invisível, aliás, atravessa fronteiras, sotaques e fusos horários com uma facilidade rara.
E por trás da expansão global do podcast está a sofisticação tecnológica: algoritmos de recomendação, análises de comportamento e a inteligência artificial já ajudam a moldar playlists personalizadas, criar vozes sintéticas e gerar transcrições automáticas. Ferramentas como a Podscribe e a Descript vêm transformando a forma como podcasts são editados e distribuídos.
Voltando ao Brasil, a oralidade que nasce no rádio, espalha-se pelos aplicativos de mensagens e encontra eco nos podcasts é parte da nossa identidade cultural. Ouvir, por aqui, é ato de resistência, de lazer, de aprendizado e de presença. Somos falantes por natureza – e agora também somos ouvintes de nós mesmos, em múltiplas telas e dispositivos.
A pesquisa da YouGov apenas confirma o que o cotidiano nos mostra: o podcast deixou de ser nicho. Tornou-se mainstream. E mais do que um formato, é uma linguagem, uma prática cultural que conecta vozes e mundos. Em tempos de ruído e dispersão, ainda há quem escolha escutar.
Fontes complementares:
- YOU GOV. Global Profiles: Podcast listeners worldwide. 2025. Disponível em: https://yougov.com
- KANTAR IBOPE MEDIA. Inside Radio Podcast Brasil. 2024.
- LARSON, Sarah. Why Podcasts Are the Perfect Medium for the Pandemic Era. The New Yorker, 2020.
- CETIC.br. TIC Domicílios 2023 – Acesso a dispositivos e conteúdos digitais.

Você pode ler e ouvir este e outros conteúdos na íntegra no RadioFrequencia, um blog que teve início como uma coluna semanal na newsletter Jornalistas&Cia para tratar sobre temas da rádio e mídia sonora. As entrevistas também podem ser ouvidas em formato de podcast neste link.
(*) Jornalista e professor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e do Mackenzie, pesquisador do tema, integra um grupo criado pela Intercom com outros cem professores de várias universidades e regiões do País. Ao longo da carreira, dedicou quase duas décadas ao rádio, em emissoras como CBN, EBC e Globo.