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quinta-feira, setembro 18, 2025

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Preciosidades do acervo Assis Ângelo: O cego na História (23)

Por Assis Ângelo

Mais uma vez o Brasil

Escapou de mergulhar

No terreno movediço

Da ditadura militar

Feia e sanguinária

Que não se cansa de matar…

 

O começo da tarde daquele 8 de janeiro de 2023 pegou de surpresa os brasilienses e brasileiros em geral.

Era um domingo ensolarado quando pelo menos 4 mil malucos e malucas quebraram tudo que encontravam na Praça dos Três Poderes. Muitos foram presos e pelo menos 1,6 mil tiveram de prestar contas à Justiça.

No começo da noite de 11 de setembro de 2025 os principais líderes golpistas pegaram penas pra eles inesperadas.

Ditadura, sabemos, é coisa que não presta.

Livro dos Cegos é obra do jornalista Marcio Salgado. Conta a história de uma mulher desaparecida durante os chamados anos de chumbo (1964-1974). Quem anda louco à procura da personagem é o filho, Antônio. O narrador, em determinado momento, depara-se com anotações em Braille feitas por alguém de nome Jeremias e com isso passa a juntar pedrinhas do jogo. Interessantíssimo.

Enquanto a ficção e a realidade se juntam no livro de Salgado, a realidade nua e crua ponteia a vida de uma mãe em busca do filho que fora sequestrado e levado à Base Aérea do Galeão, no Rio, onde teria sido assassinado. Corria o ano de 1971. A mãe chamava-se Zuzu e o filho Stuart. Ela morreu cinco anos depois do filho, vítima de um atentado provocado por trogloditas da ditadura militar.

Foi em 1976 que o baiano Milton Coelho de Carvalho foi preso e duramente castigado por ser militante do PCB. Perdeu a visão durante sessões de tortura. Morreu em abril de 2024, em Sergipe, aos 82 anos de idade.

Pululam nas crônicas, contos, poemas e romances a figura do cego, do míope…

No ótimo Fogo Morto (1943), do paraibano José Lins do Rego, acham-se o cego Torquato e o vagabundo José Passarinho. A este personagem é perguntado com quem aprendeu a cantar. Adorava beber e cantar. Era das proximidades do seleiro mestre Amaro. E ele responde mais ou menos assim: “Aprendi a cantar cantiga com um cego de Itambé”.

Em Fogo Morto aparecem soldados rasos, capitães, tenentes, coronéis, além de delegado, cangaceiro e juiz.

Tem até suicídio em Fogo Morto.

Num conto do autor paulistano Antônio de Alcântara Machado (1901-1935) intitulado Apólogo Brasileiro Sem Véu de Alegoria, o protagonista é um cego conhecido pela alcunha de Baiano. É rabequeiro. Ele está num trem lotado. De repente, o seu guia diz que o trem está completamente às escuras. E o cego na dele. O trem chega a seu destino aos trancos e barrancos, com seu interior todo depredado. A razão foi simples: o cego baiano improvisou um discurso dizendo que estava tudo errado, pois o preço das passagens cobria o que fosse preciso. Não cuidar do trem era algo impensável. Ao desembarcarem, pessoas eram abordadas pela polícia local. Um policial perguntou a um sujeitinho que carregava uma Bíblia nas mãos como tudo começou. E a resposta veio depressa: “Foi aquele cego”.

O policial, com cara amarrada, não pensou duas vezes e ao portador da Bíblia deu voz de prisão, dizendo: “Com autoridade não se brinca!”.

Contatos pelos assisangelo@uol.com.br, http://assisangelo.blogspot.com, 11-3661-4561 e 11-98549-0333

Conselho Nacional de Justiça e Jusbrasil lançam painel com dados de processos sobre liberdade de imprensa

Conselho Nacional de Justiça e Jusbrasil lançam painel com dados de processos sobre liberdade de imprensa
Crédito: Tingey Injury Law Firm/Unsplash

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Jusbrasil lançaram um painel com dados estatísticos sobre processos judiciais relacionados à liberdade de imprensa. O projeto, feito com o sistema de Inteligência Artificial do Jusbrasil, permite a consulta de processos por estado, tema, valor da causa, área do direito, tipo de decisão, tribunal, comarca, assunto, entre outros tópicos.

O painel foi lançado durante o Seminário Liberdade de Imprensa e Poder Judiciário, realizado pelo CNJ, em agosto. Segundo os dados coletados, desde 2015, foram identificados pouco mais de 24 mil processos considerados como de alta relevância, ou seja, que impactam significativamente a liberdade de imprensa no Brasil.

O tema central que mais aparece nos processos é de danos morais por reportagem, com cerca de 66% do total registrado, seguido por remoção de notícia (12,7%), propaganda eleitoral irregular (8,35%) e pedido de direito de resposta (6,4%). A maior parte dos processos detectados tramita na área cível (84%).

Entre os assuntos dos processos, a maioria aborda indenização por danos morais (cerca de 4.8 mil), e direito de imagem (quase 3 mil). Um dado positivo é que a maioria dos juízes/colegiado entendem a atividade jornalística julgada como exercício regular da profissão, com cerca de 60% do total registrado. E em cerca de 38% o entendimento foi de que o jornalismo aplicado extrapola o exercício regular da categoria.

Confira os dados do painel aqui.

Mapa de Regulamentação da ABCPública: O que é e como utilizar

O Mapa da Regulamentação é uma seção disponível no site da ABCPública que reúne normas aplicadas à comunicação dos mais diversos órgãos e instituições no Brasil. O objetivo é oferecer a profissionais, estudantes e pesquisadores uma plataforma de consulta a modelos e referências de regulamentação da área. O banco do mapa conta atualmente com mais de 200 normas e está em constante atualização.

Nele é possível encontrar normas publicadas pelos mais variados órgãos, a exemplo de Políticas de Comunicação, Manual de gerenciamento de Redes Sociais, de Relacionamento com a Mídia, de Governança de Portais, de Transmissão ao vivo de Eventos, de Cerimonial, de Identidade Visual, etc. Criada e mantida pelo Comitê de Regulamentação, o Mapa é uma das fontes de pesquisa promovida pela ABCPública. Além disso, um sistema de georreferenciamento possibilita a pesquisa por localização geográfica.

“É uma excelente fonte de consulta, mantida pelo Comitê de Regulamentação, e tem ajudado muitas pessoas da associação e fora da associação, já que é um serviço disponível ao público em geral. Eu mesma fiquei responsável por conduzir a construção da política de comunicação do meu antigo órgão, e utilizei muitos documentos disponíveis no Mapa da Regulamentação como benchmarking”, explica a coordenadora do comitê, Rachel Gonçalves.

A ideia do mapa surgiu em 2021, a partir da identificação de duas necessidades: compartilhar, entre os membros da ABCPública, as normas estruturantes dos setores de comunicação dos órgãos e incentivar a criação desses documentos como parte de um processo de transparência, um dos pilares da Comunicação Pública. Na época, Jéfferson Curtinovi, membro da associação, ficou à frente do grupo de trabalho criado para lançar a plataforma. Esse trabalho deu origem ao Comitê de Regulamentação da associação, sendo Jéfferson o primeiro coordenador.

Para acessar o Mapa de Regulamentação, clique aqui.

Também é possível para o público ajudar a completar o Mapa de Regulamentação. Caso o documento de algum órgão público ainda não esteja disponível, basta acionar a ABCPública por algum dos canais disponibilizados e enviar o arquivo para ser adicionado.

100 anos de Rádio no Brasil: Marca que ecoa além do microfone

Por Álvaro Bufarah (*)

Se antes o talento de rádio era medido em décimos de audiência Nielsen, hoje ele se redefine no ímã invisível que cria − sua marca pessoal. Essa marca transcende o estúdio, vive em plataformas, podcasts, eventos e, sobretudo, no coração do público.

Um estudo recente da Radio Ink afirma que o ativo mais valioso que um talento pode ter já não é sua posição nas grades de audiência, mas sua presença estratégica como marca. É o que permite sobreviver quando estações mudam, formatos são reinventados ou empresas são vendidas. O caso de Dave Ramsey, que expandiu um programa local para um império com livros, eventos e network de podcasts, não é exceção: é exemplo do caminho a seguir.

O cenário global do podcast exemplifica essa nova dinâmica. Em 2025, espera-se que 584 milhões de pessoas ouçam podcasts − alta de quase 7% em relação ao ano anterior − e esse número pode ultrapassar 650 milhões até 2027. Esses números impressionam, mas é ainda mais revelador que todo ouvinte dedica em média 7 horas por semana a conteúdos sonoros.

E o mercado responde em sintonia: a receita publicitária em podcasts nos EUA deverá ultrapassar US$ 2,3 bilhões em 2025, com crescimento anual de 25%. Além disso, 76% dos ouvintes tomam alguma ação após ouvir um anúncio em podcast, um indicador claro de engajamento e confiança gerados.

A introdução de vídeo nos podcasts só intensificou essa expansão. Em 2024, mais de 250 milhões de usuários assistiram podcasts em vídeo pela Spotify, e gigantes como YouTube ultrapassaram 1 bilhão de ouvintes mensais, com mais de 400 milhões de horas visualizadas em TVs.

Apoio à marca pessoal não é apenas marketing: é construção de confiança. Uma pesquisa da agência Magid revela que apresentadores de rádio e podcasts são percebidos como altamente autênticos e conectados às comunidades que servem. Essa ligação emocional rende frutos − especialmente em publicidade −, em que anúncios lidos por hosts demonstram maior credibilidade, e emissoras que combinam rádio com presença digital reforçam a conscientização da marca.

O valor da personal branding não é mito: acadêmicos confirmam sua potência. Uma análise qualitativa de estratégias para radialistas destaca a importância de consistência, autenticidade e engajamento ativo com o público por meio de plataformas digitais como redes sociais, podcasts e sites pessoais. E, num cenário mais amplo, o personal branding emerge como crucial para criadores de conteúdo ganharem destaque, confiança e oportunidades − dos conteúdos digitais ao marketing de influência.

Imagine um estúdio de rádio − microfones, sons quentes, vozes que se conectam −, mas que não termina ali. A marca pessoal revela-se quando o radialista abre um simples site ou grava um podcast extra, criando pontes com públicos que nunca ouviram sua frequência.

A marca é a identidade que você carrega para além da antena. E no ritmo acelerado do mundo moderno, essa identidade é o que faz sua voz persistir. Quando você confia na sua marca, cultiva audiência e constrói plataformas… é a sua história que segue viva, e não apenas o formato do seu programa.


Fontes de Pesquisa

  • Radio Ink – Your Brand Speaks Louder Than Ratings (2025) − radioink.com
  • DemandSage – Podcast Statistics 2025 − demandsage.com
  • Backlinko – Global Podcast Stats (2025) − backlinko.com
  • Blubrry – Podcast Industry Statistics (2025) − blubrry.com
  • Amra & Elma – Podcast Marketing Statistics (2025) − amraandelma.com
  • Business Insider – Video Podcasting Trends (2025) − businessinsider.com
  • ResearchGate – Personal Branding Strategies for Radio Broadcasters (2024) − researchgate.net
Álvaro Bufarah

Você pode ler e ouvir este e outros conteúdos na íntegra no RadioFrequencia, um blog que teve início como uma coluna semanal na newsletter Jornalistas&Cia para tratar sobre temas da rádio e mídia sonora. As entrevistas também podem ser ouvidas em formato de podcast neste link.

(*) Jornalista e professor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e do Mackenzie, pesquisador do tema, integra um grupo criado pela Intercom com outros cem professores de várias universidades e regiões do País. Ao longo da carreira, dedicou quase duas décadas ao rádio, em emissoras como CBN, EBC e Globo.

Marcelo Soares estreia coluna no J&Cia com dados sobre mercado de trabalho da comunicação

Estreou na última edição de Jornalistas&Cia a coluna J&Cia Mercado de Trabalho, assinada por Marcelo Soares, fundador do Lagom Data, que trará mensalmente dados e estatísticas sobre o mercado de trabalho do jornalismo e da comunicação no Brasil (Leia na íntegra aqui). Especializado em jornalismo de dados, Marcelo vai apresentar informações essenciais para entender as transformações do setor ao longo dos anos, incluindo movimentações, crescimento de vagas fora de redações, participação de mulheres e pessoas negras, “pejotização” do trabalho, entre outros. Na coluna de estreia, ele faz uma análise sobre as transformações do mercado formal de trabalho de jornalistas no Brasil nos últimos 30 anos, desde 1995.

Jornalista e professor baseado em São Paulo, Marcelo é especializado em jornalismo de dados e análise de estatísticas. Trabalha desde os anos 1990 com foco em análise de dados, sendo um dos pioneiros da imprensa brasileira no setor. Trabalhou em importantes projetos estatísticos, como o Excelências, um grande banco de dados de perfis de parlamentares, feito a partir da raspagem de dados públicos, que venceu o prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa. Na Folha de S.Paulo, foi o primeiro editor de desenvolvimento de audiência da imprensa brasileira, trabalhando com dados da audiência do jornal para melhor entender os leitores. Foi um dos fundadores e o primeiro gerente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).

Em 2016, deixou o dia a dia das redações e passou a prestar consultorias e dar cursos sobre análise de audiência e análise de dados. Como professor, lecionou sobre jornalismo de dados em diversas universidades do País. Também deu aulas sobre análise de dados para tradicionais veículos do Brasil. Ganhou diversos prêmios: além do Esso, venceu dois Editora Globo, em Infográfico e Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente; Grande Prêmio Folha de Jornalismo; Grande Prêmio Líbero Badaró; Grande Prêmio José de Alencar CNI de Jornalismo; SIP em Cobertura Multimídia; Wash Media Awards na categoria Água e Energia; e Synapsis FBH em Impresso.

Marcelo conversou com J&Cia sobre a coluna e a importância desses dados para o mercado da comunicação. Leia a íntegra:

Jornalistas&Cia − Fale um pouco sobre como será o seu trabalho na coluna. Que tipo de dados você trará mensalmente no espaço?

Marcelo Soares

Marcelo Soares − A ideia central é esmiuçar os dados de emprego das ocupações de jornalistas e entender tendências por atividade, região e demografia: contratações, demissões, salários e outras. Esses dados do mercado de trabalho têm uma limitação básica: eles se referem apenas ao mercado formal, com carteira assinada, algo cada vez mais raro. Também vou observar outras fontes de dados, sempre nessa mesma linha de tentar entender em que pé está o mercado de trabalho para os jornalistas nestes tempos que vivemos. Não existe lugar melhor para publicar estas análises do que o J&Cia, que sempre foi a melhor fonte para acompanhar as idas e vindas dos profissionais individuais.

J&Cia − Qual a importância dessas informações para o mercado do jornalismo e da comunicação no Brasil?

Marcelo − Os últimos dez, quinze anos foram uma época de rápidas e profundamente estruturais mudanças no mercado de trabalho dos jornalistas. A profissão multiplicou suas especializações e perdeu as trajetórias tradicionais de carreira. Vivemos tempos de “pejotização” e, como já brincou um ex-chefe meu, “uberização” profissional dos jornalistas. Já observo esses dados há bastante tempo, mas aqui vou procurar fazer isso conversando com o público e tentando aprofundar e problematizar a forma como entendemos essas tendências.

J&Cia − Conte como tem sido nos últimos anos o seu histórico de trabalho neste campo de dados sobre o mercado da comunicação. Algum tópico interessante que valha destaque com base em suas observações?

Marcelo − As classificações usadas para fins estatísticos oficiais já não funcionam para descrever, por si, a dinâmica do mercado de trabalho. Além da “pejotização” e informalização, as próprias atividades no jornalismo mudaram rapidamente. Mas, como eu sou um profissional anfíbio, que nada nos dados e corre na investigação, gosto de conhecer as limitações dos dados disponíveis para tentar procurar outras maneiras de qualificar a informação. 

J&Cia − Um dos temas do momento certamente é a inteligência artificial e seus impactos em diversas áreas, incluindo o jornalismo e a comunicação. Você falou sobre isso no debate da ESPM sobre Jornalismo Investigativo. Mas, por favor, discorra mais sobre como enxerga o uso dessa tecnologia e como ela afeta (positivamente ou não) o mercado da comunicação.

Marcelo − Um pressuposto fundamental a lembrar quando se trata de tecnologia é a primeira lei de Kransberg: a tecnologia não é por si boa e nem má − e tampouco é neutra. Ela sempre altera o ambiente de acordo com os objetivos de quem a usa. A inteligência artificial generativa facilita demais a agilização de trabalhos auxiliares ao jornalismo, como revisão, geração de sugestões de títulos, extração de nomes citados em textos etc. Ela é uma evolução da lógica, que melhorou a tradução digital, que trabalha fundamentalmente com a forma do texto. Para trabalhar com informação, é preciso checar bem, pois é imprevisível onde vai aparecer um erro.

Acho temerário usar IA generativa para trabalhar com fatos sem checar profundamente o relatório. O certo é que sempre vai aparecer algum erro. Mas a tecnologia também facilita muito a simulação de linguagem para fins enganosos, em escala, e pode facilitar a vida de quem tem mais preocupação com custo do que com a veracidade, o que potencialmente significa cortes de pessoal. Em outras ocupações, como a de programadores, tem sido observada uma situação de alta demanda por profissionais especializados e cada vez menor demanda por iniciantes. Na comunicação pode acontecer a mesma coisa. Mas, se o mercado dos principiantes for muito desidratado, como eles se tornarão profissionais mais experientes daqui a dez anos? No final, tudo depende das decisões que forem tomadas. Elas podem ser boas.

J&Cia − Com base em suas análises do mercado de trabalho desses últimos 30 anos, podemos ficar esperançosos com o futuro ou receosos com o que vem por aí? O saldo é mais positivo, negativo ou neutro?

Marcelo − O cenário que aparece é de queda no mercado mais tradicional. Ao mesmo tempo, existe um crescimento pujante de um mercado semiprofissionalizado que vem se profissionalizando, com ocupações em torno dele. Quem está lendo esta entrevista provavelmente já exerce ou é colega de alguém que exerce uma atividade que não existia quando decidimos entrar na profissão. Esse futuro está sendo construído, e cada tijolo está em nossas mãos. 

Projeto de lei paulista compromete carreiras de pesquisadores científicos

Helena Dutra Lutgens

O PLC 9/2025 da Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), projeto de lei complementar que visa instituir a carreira de pesquisador científico no estado, tem gerado controvérsias e sido alvo de críticas por parte de associações de cientistas. Elas argumentam que o projeto desestrutura a carreira existente, ao criar “cheques em branco” para o executivo e retirar a autonomia técnica de avaliações, o que poderia prejudicar a ciência paulista. Devido à falta de consenso e ao debate em curso, o projeto foi adiado em votação para permitir o diálogo entre o governo e os pesquisadores.

Nesta entrevista, a dra. Helena Dutra Lutgens, presidente da Associação dos Pesquisadores do Estado de São Paulo (APqC), detalha as objeções da categoria ao projeto. Leia na íntegra:

Portal dos Jornalistas: Como o PLC 9/2025 pode influenciar a capacidade do Estado de responder a emergências sanitárias, climáticas e agrícolas?

Helena Dutra Lutgens: Enfraquece a espinha dorsal da resposta pública. Ao desestruturar a carreira, achatar salários e criar incertezas sobre regime de trabalho e avaliação, o PLC 9/2025 acelera o esvaziamento dos institutos públicos de São Paulo, fonte principal de pesquisas contínuas e de longo prazo, essenciais para reagir a surtos sanitários, eventos climáticos extremos e crises agrícolas. Sem quadros estáveis e sem áreas experimentais ativas, perde-se velocidade, memória institucional e capacidade de ação coordenada.

Portal: Quais riscos existem para a manutenção de acervos científicos, coleções biológicas e bancos de germoplasma?

Helena: São coleções que funcionam como “bibliotecas” da variabilidade genética e do conhecimento acumulado em décadas. O esvaziamento de equipes compromete a curadoria e a conservação desses acervos; e a venda de áreas experimentais, onde muitos desses bancos estão, ameaça diretamente sua integridade e continuidade. Perder esses registros é perder a base sobre a qual novas descobertas se apoiam.

Portal: Há estimativas sobre possíveis perdas de talentos qualificados para outros estados ou países?

Helena: Ainda não há um número oficial consolidado. O que já é nítido é a tendência: achatamento remuneratório e incertezas de progressão desestimulam a permanência e dificultam a atração de novos pesquisadores, ampliando o risco de evasão para instituições com carreiras mais previsíveis. Para se ter ideia da gravidade do quadro, uma bolsa de pós-doc é de R$ 12.550,00, enquanto o reajuste proposta aos primeiros níveis de carreira pelo PLC 9/2025 é de R$ 9.052,47. A carreira se torna desinteressante para o cientista com doutorado.

Portal: Quais impactos o PLC 9/2025 pode ter sobre a autonomia administrativa e científica dos institutos públicos de pesquisa?

Helena: A proposta acumula “pontos vagos” sobre regime de trabalho e avaliação, abrindo espaço para interferências e instabilidade normativa, gerando enorme insegurança jurídica. Autonomia científica exige regras claras, estáveis e baseadas em mérito, exatamente o contrário do que propõe o PLC 9/2025.

Portal: Qual a importância do Regime de Tempo Integral (RDI) para a produção de conhecimento científico?

Helena: O RTI é a condição que garante foco, continuidade e compromisso de longo prazo, a natureza da pesquisa pública. É essa dedicação, ao longo de anos, que permite responder a problemas complexos cujo resultado não é imediato. Além disso, a mudança proposta não está clara. O PLC 09, propõe que troquemos um regime de trabalho definido de forma explicita na lei 125/1975, por um regime que será determinado após a promulgação da lei complementar por um decreto, trazendo imensa insegurança jurídica. Ou seja, é uma viagem no escuro.

Portal: A extinção da CPRTI pode impactar a credibilidade das pesquisas?

Helena: Sim. Sem uma comissão de avaliação estável, técnica e com legitimidade entre os pares, abrem-se brechas para critérios pouco transparentes e para a politização da avaliação. A própria proposta já admite incertezas sobre “como” avaliar e “como” progredir, um terreno fértil para fragilizar a credibilidade. Assim como o novo regime de trabalho, a comissão e o processo de avaliação, não estão claramente estabelecidos no projeto de lei complementar.

Portal: Como a extinção da carreira atual pode afetar a estabilidade e a motivação dos pesquisadores?

Helena: O desmonte da pesquisa pública em São Paulo não é novidade, já acontece de forma velada, há muito tempo. O achatamento salarial, o esvaziamento do quadro funcional dos institutos públicos e pesquisa, a redução de orçamento etc., são indícios claros desse propósito.

Entretanto o PLC 09/2025, desmonta uma carreira sólida, que está completando 50 anos, quebrando a espinha dorsal da carreira.  São mudanças estruturantes que tiram a autonomia da pesquisa pública, justamente o ponto indispensável para a realização de uma investigação científica idônea e isenta desmotiva equipes — com efeito dominó sobre a capacidade de entregar resultados públicos. Essa situação, somada aos demais pontos como o achatamento salarial e indefinição de critérios e falta de recursos financeiros é extremamente desmotivadora e terá como consequência um esvaziamento do quadro de pesquisadores ainda mais acelerado.

Portal: De que forma a nova estrutura proposta altera o processo de ingresso e progressão na carreira científica?

Helena: Ao tornar nebulosos os parâmetros de avaliação e progressão, a proposta desloca a lógica de mérito para um cenário de incerteza. Sem regras claras, o ingresso e a ascensão deixam de ser instrumentos de excelência e passam a ser fontes de insegurança institucional. A proposta também aumente em cerca de 6 anos o tempo para que um recém ingresso   atinja o ápice da carreira, pois eleva de 6 para 18 o número de níveis de progressão.

Portal: Que alternativas poderiam ser adotadas para modernizar a carreira sem comprometer a pesquisa pública e sua função social?

A carreira de pesquisador científico do Estado de São Paulo, completa seus 50 anos, atual e atuante, é uma carreira moderna, totalmente pautada na meritocracia, com um sistema de avaliação que efetivamente valoriza e favorece a evolução científica dos pesquisadores e das instituições de pesquisa.

Os institutos públicos de pesquisa de São Paulo, são amplamente reconhecidos pela classe científica e pela sociedade devido a sua grande contribuição ao processo de desenvolvimento, científico, tecnológico, econômico e social que deram a esse Estado. Para que essas instituições sigam contribuindo, especialmente nesse momento crítico de emergência climática e ambiental, no qual as questões de saúde, meio ambiente e agricultura, formam uma tríade imprescindível, com apenas duas ações de governo, seria possível alavancar barbaramente a carreira e as instituições: a valorização salarial dos pesquisadores e de todo o quadro funcional dos institutos, corrigindo os anos de injustiça sem qualquer correção e o provimento de cargos tanto de pesquisadores quanto das demais carreiras que atuam nessas instituições.


PERFIL

Dra. Helena Dutra Lutgens- Presidente da APqC

Pesquisadora Científica do Instituto Florestal desde 2004, Helena Dutra Lutgens é formada em Ecologia (Unesp), Mestre em Conservação e Manejo de Recursos (Unesp) e Doutora em Ecologia e Recursos Naturais (Ufscar). Antes de entrar para a carreira de pesquisadora, a ecóloga já atuava como servidora pública no cargo de assistente de pesquisa do Instituto Florestal, desde 1994. Suas principais atividades na área da pesquisa pública envolvem Unidades de Conservação, Zonas de Amortecimento, Interpretação da Natureza, Educação Ambiental, Plano de Manejo e Capacitação. No fim de 2023, após dois anos como vice-presidente da APqC, Helena foi eleita presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) para o biênio 2024/2025.

Sobre a APqC

Fundada em 1977, a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) representa servidores de 16 Institutos Públicos de Pesquisa do Estado, nas áreas de Meio Ambiente, Agricultura e Saúde. Além de incentivar o desenvolvimento da ciência, como instrumento de transformação socioambiental do Estado de São Paulo, a entidade tem como missão estabelecida em seu estatuto a defesa dos institutos e da carreira de pesquisador científico, criada em 1975, além do patrimônio público ligado à pesquisa, incluindo prédios históricos e fazendas experimentais. A entidade defende a recriação dos Institutos Florestal, de Botânica, Geológico e da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), extintos em 2020*.

Os pesquisadores representados pela APqC atuam nos institutos:

Meio Ambiente: Instituto Florestal*, Instituto de Botânica*, Instituto Geológico* (Integram a Secretaria de Estado do Meio Ambiente, infraestrutura e logística).

Agricultura: APTA Regional, Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Instituto Biológico, Instituto de Economia Agrícola (IEA), Instituto de Pesca, Instituto de Tecnologia de Alimentos, Instituto de Zootecnia (Integram a Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento).

Saúde: Instituto Adolfo Lutz, Instituto Butantan, Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, Instituto Lauro de Souza Lima, Instituto Pasteur, Instituto de Saúde, SUCEN*, Laboratório de Investigação Médica-LIM HC-USP (Integram a Secretaria de Estado da Saúde).

Unesco: metade da população global, mulheres seguem como minoria nas notícias

Crédito: Levi Guzman/Unsplash

Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

O Global Media Monitoring Project (GMMP) 2025, realizado com apoio da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), divulgado em 5/9, em Bruxelas, revelou que a representação das mulheres na mídia permanece estagnada: elas são personagens ou fontes em apenas 26% das notícias veiculadas globalmente.

O GMMP monitora a presença de gênero na mídia desde 1995. Em 2025, a coleta de notícias que deu origem ao relatório foi realizada em 6 de maio, com participação de comunicadores em mais de 100 países. Eles analisaram o noticiário de veículos impressos, televisão, rádio e plataformas digitais.

O crescimento na representação feminina nas notícias foi de apenas nove pontos percentuais em 30 anos e de apenas dois pontos nos últimos 15 anos.

A presença de mulheres é maior em notícias sobre ciência e saúde (36%), com aumento de seis pontos em relação a 2020.

Já em áreas como política (22%) e economia (25%), os avanços foram modestos.

E houve queda na representação em temas sociais e legais. A participação de mulheres como personagens ou fontes nessa cobertura recuou de 31% para 27%.

O estudo mostra que as mulheres continuam sendo representadas com maior frequência em papéis considerados cotidianos ou secundários: cidadãs comuns, celebridades, donas de casa ou testemunhas de fatos registrados pela imprensa.

A visibilidade como especialistas, porta-vozes ou lideranças é rara, mesmo com maior participação feminina em espaços de poder e profissões de destaque.

Um dado positivo é que jornalistas mulheres assinaram 41% das reportagens analisadas em 2025, avanço importante em relação aos 28% de 1995. Além disso, repórteres mulheres tendem a incluir mais mulheres como fontes: 29% nas reportagens feitas por elas, contra 24% nos textos assinados por homens.

Leia mais sobre a pesquisa em MediaTalks.


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Lúcio de Castro é o novo colunista do Lance

Lúcio de Castro é o novo colunista do Lance
Lúcio de Castro (Crédito: Divulgação/Lance)

O Grupo Lance anunciou a contratação de Lúcio de Castro, jornalista investigativo esportivo, que chega para integrar a equipe de colunistas do veículo. Ele assinará textos semanais sobre os bastidores do esporte e as relações de poder que o cercam. Lúcio também fará reportagens especiais.

“Chego ao Lance! com a mesma fome do primeiro dia de carreira. Na verdade, bem maior. Com a mesma vontade, convicções e princípios. Da única maneira que conheço de viver esse ofício: a ‘paixão insaciável’ a qual Gabo se referiu. Se não for para ser assim, não vale. E num momento rico do Lance!, em que ele amplia o olhar para muito além do campo e bola. E é esse olhar que atravessa as quatro linhas que quero sendo a alma da coluna”, declarou Lúcio, sobre o novo desafio profissional.

Formado em História e Jornalismo, Lúcio trabalhou em Jornal do Comércio, Jornal do Brasil, O Globo, TV Globo, SporTV e ESPN, sempre focado na cobertura de bastidores do esporte e trazendo reportagens sobre o que está “por trás das cortinas”. Em 2012, na ESPN, dirigiu o documentário Memórias do Chumbo – O Futebol nos Tempos do Condor, sobre a ligação entre o futebol e as ditaduras militares do continente sul-americano nas décadas de 60, 70 e 80, em Brasil, Argentina, Chile e Uruguai. Em 2016, fundou a Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo.

Ao longo da carreira, venceu importantes prêmios jornalísticos, como o Gabriel García Márquez (2013), o Vladimir Herzog (2012), o Imprensa Embratel (2003, 2004, 2006 e 2014), além de reconhecimentos internacionais, como o Prêmio Ibero-Americano da agência Unicef/EFEm (2003) e o Festival de Milão de Cinema (2013).

Mais de 900 jornalistas latino-americanos foram forçados a buscar exílio em outros países, diz relatório

Mais de 900 jornalistas latino-americanos foram forçados a buscar exílio em outros países, diz relatório
Crédito: Leon Overweel/Unsplash

Cerca de 913 jornalistas de 15 países latino-americanos entre 2018 e 2024 foram forçados a buscar exílio em outros países em busca de melhores condições de vida e de trabalho, e para proteger suas vidas, sua segurança e a de suas famílias. Os profissionais tentam reconstruir suas carreiras, mas muitos deles acabam abandonando a trajetória jornalística.

As informações são do relatório Vozes Deslocadas: Radiografia do exílio jornalístico latino-americano 2018-2024, realizado por Programa de Liberdade de Expressão e Direito à Informação da Universidade da Costa Rica, Organização Fundamedios e Cátedra UNESCO em Comunicação e Participação Cidadã na Universidade Diego Portales do Chile, com apoio da UNESCO.

Segundo o relatório, Venezuela, Nicarágua e Cuba são os países dos quais mais jornalistas fogem, representando 92% dos deslocamentos na América Latina. Os países que mais recebem jornalistas deslocados são Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, Estados Unidos, Espanha e México. E os países onde não foram identificadas saídas forçadas de jornalistas são Brasil, Belize, Costa Rica, Panamá, República Dominicana, Porto Rico e Uruguai.

A pesquisa apontou que as duas principais razões para o exílio dos jornalistas são perseguição política e ameaças do crime organizado ou de atores corruptos. O estudo foi realizado através de entrevistas com organizações, pesquisas digitais e grupos focais com jornalistas no exílio. Os organizadores do relatório afirmam, porém, que os número de profissionais deslocados deve ser ainda maior do que os detectados.

“Muitos jornalistas não reportam sua saída a nenhuma organização, e os Estados não mantêm um registro das pessoas que saem ou das pessoas que entram. O fato de 15 países terem expulsado jornalistas pelo simples fato de fazerem seu trabalho revela que as democracias na América Latina estão passando por um processo bastante significativo de erosão”, declarou Óscar Mario Jiménez, coordenador de pesquisa do relatório.

Reportagem da LatAm Journalism Review abordou os dados do relatório e entrevistou jornalistas exilados como Víctor Manuel Pérez, que chegou à Costa Rica em agosto de 2018, fugindo da Nicarágua devido à investida da ditadura de Daniel Ortega contra a imprensa; e Diobert Tocuyo, que deixou a Venezuela e chegou ao Chile em 2018, em busca de melhores condições de vida e de trabalho. Leia a reportagem aqui.

E confira os dados completos do relatório aqui.

Ricardo Kotscho receberá Prêmio IREE de Jornalismo pelo conjunto da obra

Ricardo Kotscho receberá Troféu Audálio Dantas
Ricardo Kotscho (Crédito: Brasil de Fato/YouTube)

Ricardo Kotscho, hoje colunista do UOL, receberá em dezembro o Prêmio IREE de Jornalismo pelo Conjunto da Obra, concedido pelo Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa (IREE). Criado em 2020, o prêmio expressa a contribuição do instituto com a liberdade de informação e opinião, pilares do regime democrático.

Segundo o IREE, a categoria Conjunto da Obra é atribuída a profissionais “que contribuíram de maneira inconteste para que a imprensa livre exerça seu papel no País. Os seus 61 anos de atividade espelham os valores que nosso instituto pretende celebrar: excelência técnica, compromisso com a ética, a democracia, as liberdades e os direitos humanos”.

Foram contemplados anteriormente nessa categoria Elio Gaspari, Fernando Gabeira, Orlando Brito (in memoriam), Evandro Teixeira e Ruy Castro. O jantar de entrega será em 11 de dezembro, em São Paulo.

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